sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Trabalhista -> Lei nº 9.601/98 - Contrato de Trabalho por Prazo Determinado - Fonte: FiscoSoft

Publicado em nosso site: 26/08/2003
Comentário - Previdenciário/Trabalhista - 2003/0217

Lei nº 9.601/98 - Contrato de Trabalho por Prazo Determinado

1.Introdução

Através da Lei nº 9.601/98, regulamentada pelo Decreto n" 2.490/98, foram reguladas as regras para a formalização do contrato de trabalho por prazo determinado, de que trata o art. 443 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, independentemente das condições estabelecidas em seu § 2º, para admissões que representem acréscimo no número de empregados em qualquer atividade desenvolvida pela empresa ou estabelecimento.

2.Exigências

O empregador deverá afixar, no quadro de avisos da empresa, cópias do acordo ou da convenção coletiva da relação dos contratados, que conterá, entre outras informações, o nome do empregado, o número da Carteira de Trabalho (CTPS), o número do PIS e as datas de início e término do contrato.

Somente poderão contratar empregados pelo referido regime as empresas que estiverem em dia com o INSS e o FGTS,

3.Limites para Contratação

O contrato de trabalho temporário, em fase de implantação, somente poderá ser utilizado no sentido de aumentar o quadro de empregados, não sendo aceita sua adoção como mero instrumento de substituição dos então efetivos por temporários.

4.Prazo de Validade do Contrato de Trabalho

O contrato vale por dois anos, sendo que, após este prazo, o empregado deverá ser efetivado ou dispensado.

O número de empregados contratados em regime temporário observará o limite estabelecido no instrumento decorrente da negociação coletiva, não podendo ultrapassar os percentuais aplicados cumulativamente:

- 50% do número de trabalhadores, para a parcela inferior a 50 empregados;

- 35% do número de trabalhadores, para a parcela entre 50 e 199 empregados;

-20% do número de trabalhadores, para a par cela acima de 200 empregados.

As parcelas mencionadas resultarão da média mensal aritmética do número de empregados contratados por prazo indeterminado pelo estabelecimento, nos 6 (seis) meses anteriores à data da publicação da Lei n. 9.601/98.

Para se alcançar a média aritmética, adotar-se-ão os seguintes procedimentos:

a) apurar-se-á a média mensal, somando-se o número de empregados com

vínculo empregatício por prazo indeterminado de cada dia do mês e dividindo-se o seu somatório pelo número de dias do mês respectivo;

OBS:

Na contagem considerar-se-ão todos os dias do mês, trabalhados ou não (art. 1º da Portaria nº 207/98).

b) apurar-se-á a média semestral pela soma das médias mensais dividida por seis.

Os estabelecimentos instalados ou os que não possuíam empregados

contratados por prazo indeterminado a partir de 1º de julho de 1997 terão sua média aritmética aferida contando-se o prazo de seis meses a começar do primeiro dia do mês subsequente à data da primeira contratação por prazo indeterminado.

Fixada a média semestral, para se alcançar o número máximo de empregados que poderão ser contratados na modalidade do contrato por prazo determinado nos termos da Lei nº 9.601/98, proceder-se-á da seguinte forma:

I - para estabelecimentos com média semestral até 49 empregados, aplicar-se-á o percentual de 50%;

II - para estabelecimentos com média semestral de cinquenta a 199 empregados, subtrair-se-á 49 empregados, aplicando-se o percentual de 35% sobre o remanescente, somando-se ao resultado 24,5 empregados;

III - para estabelecimentos com média semestral igual ou superior a 200 empregados, subtrair-se-á 199 empregados e aplicar-se-á o percentual de 20% sobre o remanescente, somando-se ao resultado 77 empregados.

No resultado obtido, as frações decimais até quatro décimos serão desprezadas, considerando-se o número inteiro, e para as frações decimais iguais ou superiores a cinco décimos considerar-se-á o número inteiro imediatamente superior.

5.Critérios para Indenizações

Cabe aos sindicatos e às empresas estabelecerem, por meio de convenção ou acordo coletivo, a indenização para as hipóteses de rescisão antecipada do contrato de trabalho por prazo determinado, por iniciativa do empregador ou do empregado, não se aplicando o disposto nos arts. 479 e 480 da CLT, bem como multas pelo descumprimento de suas cláusulas.

Na rescisão, sem justa causa, de contrato por prazo indeterminado, por iniciativa do empregador, o empregado faz jus a indenização de 40% sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), a título de multa rescisória.

Já no contrato de trabalho celebrado nos termos da Lei nº 9.601/98, o empregador fica dispensado do pagamento desta multa, devendo., entretanto, fixar outra multa no acordo coletivo da categoria.

6.Contribuições Previdenciárias e Depósitos ao FGTS

A admissão de empregados nos termos da referida Lei beneficia a empresa, pois há redução real do custo dos encargos: a contribuição do empregador para o "Sistema S" (SESI, SENAI, SESC, SEBRAE, entre outros) passa a ser 50% menor do que seu valor vigente em 1º.01.96. Essa contribuição é variável, conforme a atividade desenvolvida pela empresa. A alíquota do recolhimento para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) cai de 8% para 2%.

7. Prorrogação do Prazo Previsto no art. 2º da Lei nº9.601/98

Segundo a mencionada Lei nº 9.601/98, art. 2º, referida redução em 50% das alíquotas das contribuições sociais destinadas ao SESI, SESC, SEST SENAI,SENAC, SENAT, SEBRAE, Salário- Educação, financiamento do seguro de acidente do trabalho, bem como a alíquota de 2% da contribuição para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço -FGTS, seria aplicada por dezoito meses, a partir de 22.01.98.

Esse prazo de dezoito meses foi alterado por meio da Medida Provisória n" 1.779-11, art. 72 , que modificou a redação do caput do art. 2a da Lei nº 9.601/98, que passou a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 2º - Para os contratos previstos no artigo anterior, são reduzidas, por trinta e seis meses, a contar da data de publicação desta Lei:"

Desse modo, as empresas acabaram tendo os encargos mencionados reduzidos por mais dezoito meses.

Não obstante, informamos que , tendo em vista a falta de publicação de norma legal que prorrogasse o prazo de 60 meses, expirado em 22/01/2003, que garantia a redução dos encargos sociais devidos à "terceiros", arrecadados pelo INSS, e do percentual da contribuição do FGTS, estes passam a ser exigidos na sua integralidade.

8.Fundamentos Legais

Mencionados no texto.

Artigos da CLT: 443, caput e § 2º.




Dra. Líris Silvia Zoega Tognoli do Amaral
Consultora FISCOSoft On Line
É Advogada; Pós-graduada em Direito do Trabalho e Previdência Social; Experiência de mais de 13 anos nas áreas de direito do trabalho, previdenciário e FGTS.
E-mail: liris@fiscosoft.com.br


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Trabalhista -> Repouso Semanal Remunerado - Fonte: FiscoSoft

Publicado em nosso site 30/09/2003
Comentário - Previdenciário/Trabalhista - 2003/0233

Repouso Semanal Remunerado

1.Introdução

Todo empregado urbano, rural ou doméstico tem direito ao Repouso Semanal Remunerado - RSR de 24 horas consecutivas, preferentemente aos domingos nos limites das exigências técnicas das empresas, nos feriados civis e religiosos, de acordo com a tradição local.

Além do descanso, faz jus também o empregado à respectiva remuneração, conforme determina a Lei nº 605/49, regulamentada pelo Decreto nº 27.048/49.

2. Faltas Justificadas

Para que o empregado tenha direito a remuneração correspondente ao repouso, é necessário o cumprimento integral da jornada de trabalho semanal, sem faltas, atrasos e saídas durante o expediente.

Certas ausências, entretanto, são legais e, sim, não acarretam perda da remuneração do repouso semanal remunerado. São elas:

a)até dois dias consecutivos em virtude de falecimento do cônjuge, ascendente (pais, avós etc.), descendente (filhos, netos etc.), irmão ou pessoa que, declarada na CTPS do empregado, viva sob a sua dependência econômica;

b) até três dias consecutivos, em virtude de casamento;

c) um dia, em cada doze meses de trabalho, em caso de doação voluntária de sangue, que deve ser comprovada;

d) até dois dias, consecutivos ou não, para o fim de alistamento eleitoral;

e) período de tempo necessário ao cumprimento das exigências do serviço militar;

f) ausência para realização de exame vestibular para ingresso em estabelecimento de ensino superior, devidamente comprovada;

g) nos casos de doença, devidamente comprovada. Nesta hipótese, a justificativa da ausência deve observar a ordem preferencial dos atestados médicos estabelecida em lei, assim:

1 - médico da empresa;

2 - médico do órgão previdenciário;

3 - médico do Sesi, Sesc, Senar ou Sest;

4 - médico de repartição federal, estadual ou municipal, incumbida de assuntos de higiene e saúde;

5 - inexistindo na localidade os médicos acima especificados, por médico do Sindicato a que pertença o empregado ou por profissional da escolha deste;

h) ausência por motivo de acidente do trabalho;

i) paralisação das atividades por motivo exclusivo do empregador;

j) ausência justificada pela empresa, assim entendida aquela que não houver acarretado o correspondente desconto na remuneração;

k) as ausências motivadas pelo comparecimento necessário à Justiça do Trabalho (reclamante, testemunha, parte etc.);

l) durante o licenciamento compulsório da empregada por motivo de maternidade ou aborto, observados os requisitos para percepção do salário maternidade custeado pela Previdência Social;

m) até nove dias no caso de professor, por motivo de gala ou luto, em conseqüência de falecimento do cônjuge, do pai ou mãe, ou de filho;

n) durante a suspensão preventiva para responder a inquérito administrativo ou de prisão preventiva quando for impronunciado ou absolvido;

o) cinco dias, no caso de nascimento de filho, licença- paternidade, nos termos do art. 10, § 1º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias ADCT, da Constituição Federal de 1988.

Nota: Com o advento da Lei nº 5.890/73, foram transferidos, para a empresa que dispõe de serviço médico próprio ou em convênio, o exame médico e o abono das ausências que não ultrapassarem 15 dias. Todavia, o atestado médico do órgão previdenciário não deve ser recusado por essas empresas, pois a jurisprudência o considera válido, para o fim de justificar disciplinarmente a ausência, isto é, embora o empregado sofra o desconto relativo, não deve ser punido (art. 75, caput e § 1º do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto 3.048/99, com nova vedação dada pelo Decreto nº 3.265/99).

3. Mensalistas e Quinzenalistas

Há controvérsia quanto ao desconto ou não do repouso semanal remunerado do empregado mensalista e quinzenalista, quando faltam ao serviço sem justificativa legal, em virtude do disposto nos arts. 6º e § 2º, da Lei nº 605/49:

"Art. 6º - Não será devida a remuneração quando, sem motivo justificado, o empregado não tiver trabalhado durante toda a semana anterior, cumprindo integralmente o seu horário de trabalho.

§2º - Consideram-se já remunerados os dias de repouso semanal do empregado mensalista ou quinzenalista, cujo cálculo de salário mensal ou quinzenal, ou cujos descontos por falta sejam efetuados na base do número de dias do mês ou de 30 (trinta) e 15 (quinze) diárias, respectivamente."

Há entendimento jurisprudencial no sentido que o mensalista e o quinzenalista não estão sujeitos à assiduidade para fazer jus à remuneração do repouso semanal, ou seja, ainda que faltem ao trabalho sem justificativa legal, desconta-se somente o valor correspondente ao dia da falta, visto os dias de repouso serem considerados já remunerados, por estarem inclusos no salário mensal ou quinzenal.

Nesse sentido, dispõe o seguinte acórdão:

"O empregado mensalista, que faltar ao serviço, fica sujeito à perda do salário correspondente ao dia de ausência, sem prejuízo do repouso semanal remunerado. A exigência de freqüência integral, na semana, restringe-se ao empregado diarista. Revista provida para assegurar o pagamento do repouso." (Ac. TST -1a Turma - Proc. RR 5.100/79, Rel. Min, Raymundo de Souza Moura publicado em audiência de 04.02.81 - DJU de 06.02.81).

Entretanto esse entendimento não é pacífico conforme demonstra o seguinte acórdão:

"Em alcançando o salário do mensalista a remuneração dos trinta dias do mês - art. 7o, § 2o, da Lei nº 605, - tem-se como pertinente o disposto no art. 6º, segundo o qual a falta injustificada no correr da semana torna indevido o pagamento do repouso, autorizado, portanto, o desconto não só do dia da ausência, como também daquele destinado ao repouso. Entendimento diverso leva ao estabelecimento de verdadeiro privilégio, com a manutenção, em relação aos mensalistas, do direito ao repouso, independente da assiduidade durante a semana." (Acórdão unânime do Plenário do TST - E RR 4019/79 - Rel. Min. Marco Aurélio - DJU de 11.03.83, pág. 2.542).

Desse modo, a empresa poderá adotar qualquer dos procedimentos expostos. Se, entretanto, estiver seguindo o critério de não descontar o RSR de mensalista e quinzenalista e vier a fazê-lo, poderá ser surpreendida com a argüição de nulidade dessa alteração por contrariar o art. 468 da CLT, que considera lícitas apenas as alterações dos contratos de trabalho que resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado.

Nesse aspecto, vale observar o seguinte acórdão:

"Se há longos anos é observada na empresa a normalidade de retribuir o repouso do mensalista, mesmo diante de faltas ao serviço porventura ocorridas na semana antecedente, não poderá o empregador revogá-la, sob pena de violar condição que se inseriu no pacto laboral." (Acórdão da 2a Turma do TST - RR - 4.232 Min. Vieira Mello).

Lembra-se, finalmente, que nos termos do Precedente Normativo TST nº 92, aprovado pela Resolução Administrativa nº 37/92, ficou estabelecido:

"92 - Garantia de Repouso Remunerado - Ingresso Atraso (positivo): Assegura-se repouso remunerado a empregado que chegar atrasado, quando permitido seu ingresso pelo empregador, compensando o atraso no final da jornada de trabalho da semana. (Ex PN 145)"

4. Trabalho em Dias de Repouso

Às empresas em que, em razão de interesse público ou pelas condições peculiares às próprias atividades ou ao local onde são exercidas, seja indispensável a continuidade do trabalho, é concedida em caráter permanente permissão para o trabalho em dias de repouso, hipótese em que o empregador deverá conceder outro dia de folga ao empregado.

Tais empresas deverão elaborar a escala de revezamento mensal para determinar um outro dia de folga aos empregados.

As atividades autorizadas a funcionar nos dias destinados ao repouso constam de relação anexa ao Decreto nº 27.048/49.

5. Escala de Revezamento

Nos serviços que exijam trabalho aos domingos exceto os elencos teatrais e congêneres, será estabelecida escala de revezamento, mensalmente organizada e constante de quadro sujeito à fiscalização. O modelo da escala de revezamento é de livre escolha da empresa, organizada de maneira que, em um período máximo de 7 semanas de trabalho, cada empregado usufrua ao menos um domingo de folga (CLT, art. 67, parágrafo único, e Portaria Ministerial nº 417, 10.06.66, com redação da Portaria MTPS nº 509/67).

5.1. Mulher

Para as mulheres, referida escala deve ser organizada quinzenalmente, favorecendo o repouso dominical (CLT, art. 386).

5.2 Estabelecimentos Autorizados

Para os estabelecimentos autorizados a funcionar em feriados civis e religiosos, os empregados que trabalharem nesses dias terão direito à remuneração em dobro, salvo se a empresa estabelecer outro dia folga.

Exemplo:

Empregado contratado para jornada de 8 horas normais diárias é convocado para trabalhar no domingo. Suponha-se que seu salário seja de R$ 3,00 por hora. Teremos:

Remuneração do RSR = R$ 24,00 (R$ 3,00 x 8 h) = um dia de serviço

Remuneração do serviço no domingo = R$ 24,00 (R$ 3,00 x 8 h) = jornada de domingo

Total a receber relativo a esse dia = R$ 48,00

Observe-se que algumas empresas costumam pagar, principalmente para mensalistas, além do salário integral relativo ao mês, no qual já está incluído o RSR, a remuneração dobrada pelo trabalho no domingo. Note-se que, nesse caso, o pagamento é triplo.

Daí o Enunciado nº 146 do TST: "O trabalho realizado em feriado, não compensado, é pago em dobro e não triplo" (ex- prejulgado nº 18 do TST).

Cumpre ressaltar, no entanto, que a constância no pagamento triplicado implica vantagem tacitamente integrada aos contratos de trabalho, podendo importar a modificação do sistema, em alteração ilícita do contrato de trabalho.

6. Empresas Não Autorizadas para o Trabalho aos Domingos

As empresas com atividades que exijam trabalho nos dias de repouso que não constem da relação de permissão para esse fim devem apresentar o pedido à Delegacia Regional do Trabalho, conforme Portaria MTb nº3.118/89.

Os pedidos de autorização devem ser instruídos com os seguintes documentos:

a)laudo técnico elaborado por instituição Federal, Estadual ou Municipal, que indique as necessidades de ordem técnica e os setores que exigem a continuidade do trabalho, com validade de 04 (quatro) anos;

b) acordo coletivo de trabalho ou anuência expressa de seus empregados, manifestada com a assistência da respectiva entidade sindical; e

c) escala de revezamento, observado o disposto na Portaria Ministerial nº417, de 10 de junho de 1966.

6.1 Caráter Eventual

As empresas não enquadradas no subitem anterior podem, excepcionalmente, realizar trabalho em dia de repouso:

- por motivo de força maior, devendo comunicar o fato à Delegacia Regional do Trabalho (DRT) no prazo de 10 dias; ou

- com autorização prévia da DRT e com discriminação do período autorizado de 60 dias no máximo, de cada vez, para atender à realização ou conclusão de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto. Nesse caso, se a empresa não determinar outro dia de folga, a remuneração será paga em dobro, na forma estabelecida acima.

7. Comércio Varejista em Geral

Com o advento da Medida Provisória nº 1.539/36/97, art. 6º (atual Lei nº 10.101/2000), que autorizou, a partir de 09.11.97 o trabalho aos domingos no comércio varejista em geral observado o art. 30, inciso l, da Constituição Federal, o repouso semanal remunerado deverá recair no domingo, a cada período máximo de 4 semanas, respeitadas as demais normas de proteção ao trabalho e outras previstas em acordo ou convenção coletiva.

8. Remuneração

A remuneração dos dias de repouso, tanto o semanal como o correspondente aos feriados, integram o salário para todos os efeitos legais e com ele deve ser paga.

O valor da remuneração do descanso para os que trabalham por dia, semana, quinzena ou mês equivale a um dia de serviço e para os horistas, corresponde à respectiva jornada normal de trabalho.

8.1 Requisito necessário para o pagamento do RSR

Ao horista, diarista e semanalista, o direito ao repouso semanal depende do empregado trabalhar durante toda a semana anterior, cumprindo integralmente o horário de trabalho.

Contudo, na hipótese da empresa adotar o procedimento do não-desconto do RSR, quando tais empregados deixarem de cumprir a jornada semanal integral, não poderá fazê-lo aos que já vinham sendo beneficiados com a medida, sob pena de argüição de nulidade dessa alteração por ofensa ao princípio da inalterabilidade das condições contratuais que impliquem, direta ou indiretamente, prejuízos ao emprego (art. 468 da CLT).

8.2 Folha de pagamento

Deve-se salientar o RSR nas folhas e recibos de pagamento, exceto para o mensalista e o quinzenalista. Nesse sentido, dispõe o Enunciado TST nº 91:

"Nula é a cláusula contratual que fixa determinada importância ou percentagem para atender englobadamente vários direitos legais ou contratuais do trabalhador."

Havendo prestação de horas extras, deve-se destacar também sua repercussão no repouso, inclusive para o mensalista e o quinzenalista.

Quanto aos comissionistas, veja adiante.

8.3 Cálculo

8.3.1 Semanalista, diarista e horista

Para os contratados por semana, dia ou hora, a remuneração do repouso corresponde a um dia normal de trabalho. Sendo a jornada normal diária de trabalho variável, a remuneração corresponderá a 1/6 do total de horas trabalhadas durante a semana.

"Repouso Semanal Remunerado. A remuneração do repouso semanal é regida pelo art. 7º da Lei nº 605/49 e deve corresponder a um dia de serviço, isto é, a sete horas e vinte minutos, desde a vigência da Constituição Federal de 1988." (Ac. da 1a T do TRT da 12a R - mv, no mérito - RO 682/90 - Rel. Juiz Armando L. Gonzaga - j 30.01.91 - DJ SC 28.03.91, p 37)

8.3.2 Tarefeiro e pecista

Aos empregados contratados por tarefa ou peça, a divisão do salário relativo às tarefas ou peças executadas durante a semana, no horário normal de trabalho, faz-se pelo número de dias de serviço efetivamente trabalhados.

Exemplo (tarefeiro):

- nº de tarefas executadas na semana: 80

- valor da tarefa: R$ 1,80

- salário relativo às tarefas ( R$ 1,80 x 80): R$ 144,00

- RSR: R$ 144,00 ÷ 6 (dias efetivamente trabalhados): R$ 24,00

Exemplo (pecista):

- nº de peças realizadas na semana: 420

- valor da peça :R$ 0,80

- salário relativo às peças (R$ 0,80 x 420): R$ 336,00

-RSR: R$ 336,00 ÷ 6 (dias efetivamente trabalhados R$ 56,00

8.3.3 Rural

Os rurais que trabalham por tarefa predeterminada recebem o quociente da divisão do salário convencionado pelo número de dias fixados à respectiva execução.

Exemplo (rural):

- nº de tarefas predeterminadas na semana:60

- valor da tarefa: R$ 0,90

- salário relativo às tarefas (R$ 0,90 x 60): R$ 54,00

RSR:R$ 54,00 ÷ 6 (dias fixados à respectiva execução)R$ 9,00

8.3.4 Comissionista

Segundo a Súmula nº 201, do Supremo Tribunal Federal:

"O vendedor pracista, remunerado mediante comissão, não tem direito ao repouso semanal remunerado."

Entretanto, o Tribunal Regional do Trabalho (TST), por meio do Enunciado nº 27, entende de forma diversa:

"É devida a remuneração do repouso semanal e dos dias feriados ao empregado comissionista, ainda que pracista."

Seguindo a orientação da Justiça do Trabalho, calcula-se o RSR somando-se as comissões percebidas durante a semana e dividindo-se pelo número de dias úteis da respectiva semana:

Exemplo:

- valor total das comissões recebidas na semana: R$ 510,00

- nº de dias trabalhados na semana: 5

- nº de dias úteis da semana; 6

-RSR = R$ 510,00 ÷ 6 R$ 85,00

Para o cálculo mensal, dividir o total das comissões pelo nº de dias úteis e multiplicar pelo nº de domingos e feriados do mês:

Exemplo:

- valor total mensal das comissões: R$ 2.400,00

- nº de dias úteis do mês 24

- no de feriados e domingos: 6

- R$ 2.400,00 ÷ 24 = R$ 100,00

- RSR = R$ 100,00 x 6 R$ 600,00

Os exemplos foram elaborados com base no entendimento jurisprudencial, abaixo transcrito:

"Comissionista que não trabalha aos sábados. Cálculo da remuneração dos repousos. A inexistência de trabalho aos sábados não resulta num duplo repouso semanal remunerado. ASSIM o repouso sobre as comissões se calcula pelo divisor 1/6 e não 1/5." (Acórdão da 2a Turma do TRT da 3a Região - RO - 932/8;

Rel. Juiz Edson A. Fiúza - "Minas Gerais" de 26.07.85, p 23)

"O pagamento do repouso semanal remunerado deve ser proporcional ao número dos dias da semana e não ao quantitativo dos dias trabalhados. À exegese restritiva, com base no § 3o do art. 6º da Lei nº 605, de 05.01.49, é aplicável mesmo quando jornada semanal é imposta por interesse do empregador, em termos de operacionalidade." (TST - E. - RR - 3.138/78 - TRT - Região - Ac. TP = 1668/80 - DJU 19.08.80, p 7.233)

"Para a fixação do valor do repouso de comissionista, divide-se o produto mensal das comissões pelo número dos dias úteis do mês em causa." (TRT - 1a R. - Ac. 1.259 da 2a T., de 27.08.74 - RO 2.114/74 - Rel. Juiz Gustavo Câmara Simões Barbosa)

Contudo, por analogia ao art. 7º, alínea "c", da Lei nº 605/49, que dispõe sobre repouso do tarefeiro e do pecista, há os que entendem que o cálculo do RSR sobre as comissões é feito dividindo-se a soma das comissões percebidas durante a semana pelo número de dias de serviço efetivamente prestado ao empregador:

"Comissionista que trabalha apenas cinco dias na semana deve ter a remuneração do seu repouso semanal calculada pelo equivalente às comissões auferidas pelos dias efetivamente trabalhados, por aplicação analógica da regra contida na alínea "c" do art. 7º da Lei nº 605/49." (Acórdão da 1a Turma do TRT da 3a Região - RO - 3.396/87 - Rel. Juiz Abel Nunes da Cunha - "Minas Gerais" II, de 29.01.88, p 29)

8.3.5 Mensalistas e quinzenalistas

No salário dos empregados mensalistas e quinzenalistas já está inclusa a remuneração do repouso semanal.

8.3.6 Domicílio

Aos empregados que trabalham em domicílio, o valor do repouso semanal corresponde ao quociente da divisão da importância total da produção na mesma semana por 6:

- valor total da produção na semana: R$ 300,00

-RSR = R$ 300,00 ÷ 6 R$ 50,00

8.3.7 Jornada Reduzida

O empregado admitido para trabalhar em jornada reduzida faz jus ao RSR, calculado pela divisão do ganho semanal por seis.

Sobre o assunto, o Tribunal Superior do Trabalho proferiu os seguintes acórdãos:

"Contratado o empregado para trabalhar em três dias da semana, cálculo para pagamento do descanso semanal será o resultado da divisão do ganho semanal por seis. Exegese à letra 'a' do art. 7º da Lei nº 605/49. Embargos acolhidos para restabelecer o acórdão regional." (Ac. TST-TP-E-RR - 0377/80 - Proc. 4582/77 - DJU de 18.04.80, p 2.593)

"Nos contratos em que não trabalha o empregado em todos os dias da semana, o, cálculo para pagamento do descanso semanal se faz dividindo o ganho na semana por seis, eis o que o descanso sempre corresponde ao trabalho na semana. Embargos acolhidos." (TST-E-RR - 1.855/78 - TRT 2a Região - Ac. TP -0516/80 - DJU 11.04.80, p 2.252)

Exemplo:

- dias trabalhados na semana 4

- salário semanal R$ 240,00

-RSR (R$ 240,00) ÷ 6 R$ 40,00

9. Adicionais

A jurisprudência consagrou, por meio dos Enunciados nºs 60 e 172 do TST, respectivamente, a integração das horas noturnas e extras habitualmente prestadas, no cálculo do Repouso Semanal Remunerado.

A partir de 10.12.85, a obrigatoriedade de integração das horas extraordinariamente prestadas no cálculo do Repouso Semanal passou a constar da própria legislação pertinente em face da modificação introduzida pela Lei nº 7.415/85 nas alíneas "a" e "b" do art. 7º da mencionada Lei nº 605/49.

Tal integração deverá ser feita conforme média diária do número de horas extras e/ou noturnas realizadas na semana, quinzena ou mês. A hora extra será de valor igual ao da hora normal acrescida do respectivo adicional (mínimo de 50%).

Exemplo:

Empregado com jornada de 8 horas normais diárias, de 2a a 6a feira, e 4 horas no sábado, percebe salário de R$ 2,00 por hora. Excedeu sua jornada normal em duas horas diárias, no período de 2a a 6a feira, perfazendo um total de 10 horas extraordinárias e a média diária de 2 horas.

- R$ 2,00 (salário/hora normal) + 50% (ad, hora extra) = R$ 3,00 (valor da hora extra)

- R$ 3,00 x 2 (média diária) = R$ 6,00 (valor a ser integrado no RSR)

9.1 Horas noturnas

O adicional noturno, pago com habitualidade integra o salário do empregado para todos os efeitos legais; portanto, repercute também na remuneração do repouso semanal.

Entretanto, é indevida a inclusão, no RSR, de adicionais decorrentes de condições penosas de trabalho como por exemplo os adicionais noturno, perigoso ou insalubre, quando estes, pelos seus totais, englobarem a remuneração mensal, ou seja:

Exemplo:

Empregado mensalista com salário de R$ 1.000,00 e que preste os serviços em atividade considerada perigosa perceberá, além do salário normal, mais 30% sobre este a título de adicional de periculosidade, nos termos do § 1a do art. 193 da CLT, ou seja:

- Salário mensal = R$1.000,00

- Salário acrescido do adicional de periculosidade:1,30 x R$1.000,00=.R$1.300,00

Constata-se, neste caso, que em virtude de adicional de periculosidade ser calculado sobre o salário mensal, incluindo, conseqüentemente, a remuneração do RSR, não há de se efetuar qualquer cálculo que vise a integração do adicional nos dias de descanso, posto que já está incluso no salário mensal.

"Adicional de insalubridade - Reflexos: O adicional de salubridade, por ter como base de cálculo o salário mínimo mensal, já remunera todos os dias do mês, sendo indevida sua incidência nos DSRs." (Ac un da 8a T do TRT da 2a R - RO 02920318262 - Rel. Juiz Sérgio Prado de Mello - j 28.11.94 - DJ SP 12.01.95, p 74)

"Adicional de insalubridade - Não- incidência sobre o repouso remunerado. Por constituir parcela fixa mensal, o acréscimo por insalubridade não incide sobre os descansos remunerados". (Ac un da 1a T do TRT da 2a R - RO 02890090650 - Rel. Juíza Dora Vaz Teviño - j 22.08.90 - DJ SP 04.09,90, p 91)

9.2 Gorjetas

Nos termos do Enunciado TST nº 354, ficou estabelecido:

"354. Gorjetas - Natureza jurídica - Repercussões. (Revisão do Enunciado nº 290)

As gorjetas, cobradas pelo empregador na nota de serviço ou oferecidas espontaneamente pelos clientes, integram a remuneração do empregado, não servindo de base de cálculo para parcelas de aviso prévio, adicional noturno, horas extras e repouso semanal remunerado."

9.3 Gratificações

Consoante o Enunciado TST nº 225, há a seguinte previsão:

"225 - Repouso Semanal - Cálculo - Gratificações de produtividade e por tempo de serviço.

As gratificações de produtividade e por tempo de serviço pagas mensalmente, não repercutem no cálculo do repouso semanal remunerado."

Quanto às gratificações semanais, pode-se o observar o seguinte acórdão:

"Bonificações. Reflexos - As bonificações (gratificações pagas semanalmente, de forma habitual, em contraprestação ao trabalho prestado, integram o salário do obreiro, gerando, inclusive, reflexos no RSR, pois somente as verbas pagas de modo fixo, mensal ou quinzenalmente, é que já têm embutida a retribuição do repouso remunerado. Recurso de Revista patronal conhecido desprovido." (Ac un da 2a T TST - RR 173.451/95.0-3a R - Rel. Min. Moacyr Roberto Tesch Auersvald - j 10.04.96 - DJU 1 24.05.96, pg. 17.642)

10. Encargos Sociais

A remuneração dos dias de repouso obrigatório tanto os do repouso semanal como aqueles correspondentes aos feriados, é parte integrante do salário (art. 10 do regulamento anexo ao Decreto nº 27.048/49) portanto, sofrem incidências de INSS, FGTS e IRF (Lei nº 8.212/91, art, 28, l; Lei nº 8.036/90, art. 15; e art. 6o do Decreto nº 3.000/99).

11.Vendedor Viajante

É assegurado ao empregado vendedor viajante, após cada viagem, um intervalo para descanso, calculado na base de 3 dias por mês da viagem realizada, não podendo, porém, ultrapassar o limite de 15 dias. Lembra-se que o referido empregado não poderá permanecer em viagem por tempo superior a 6 meses consecutivos. Vale destacar que tal garantia não prejudica o direito do empregado vendedor viajante ao descanso semanal remunerado (Lei nº 3.207, de 18.07.57- DOU de 22.07.57, art. 9º combinado com o art. 1º).

12. Empregado Doméstico

Aos empregados domésticos ficou assegurado, pela Constituição Federal, art. 7º, parágrafo único, combinado com o inciso XV, o repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos.

Dessa forma, salvo nas hipóteses de contração de empregado doméstico quinzenalista ou mensalista, cujas remunerações já incluem os repousos semanais, o empregador doméstico deverá pagar e discriminar separadamente a citada parcela no recibo de pagamento de salário, a fim de que possa, inequivocamente, ficar comprovada sua quitação.

Aos que trabalham como diaristas em alguns dias da semana, o cálculo do repouso corresponde 1/6 do total da retribuição paga nos dias trabalhados na semana.

13. Professor

Nos termos do Enunciado do TST nº 351, o professor que recebe salário mensal à base de hora- aula tem direito ao acréscimo de 1/6 a título de repouso semanal remunerado, considerando-se para esse fim o mês de quatro semanas e meia.

Assim, para cálculo do RSR do professor, pode- se observar os seguintes acórdãos:

"Professor - repouso semanal remunerado - O salário correspondente a quatro semanas e meia de trabalho, a que se refere o art. 320, da Consolidação das Leis do Trabalho visa apenas fixar a média da atividade do professor durante o mês, cujo critério, todavia, não exclui a obrigatoriedade do pagamento dos repousos semanais, cuja forma de cálculo é na base de (1/6) um sexto, do salário da hora- aula, ministrado durante a semana. Recurso de Revista não provido." (Ac un da 1a T do TST -120.403/94.0- 9a R - Rel. Min. Lourenço Prado - j 15.05.96 - DJU 1 21.06.96, p 22.502).

"Professor - repouso semanal remunerado - quando é devido. O professor remunerado à base de hora- aula tem o direito ao pagamento do repouso semanal remunerado, à base de 1/6 (um sexto), do que lhe é devido na semana respectiva, ainda que receba o pagamento dos salários a cada mês, e ainda que se considere este constituído de quatro semanas e meia. Embargos conhecidos mas não providos." (Ac. un da SBDI-1 do TST - ERR 84.658/93.6-9º R - Rel. Min. Vantuil Abdala - j 21.10.96 - DJU 1 29.11.96.p47.407).

14. Bancário

Por meio do Enunciado do TST nº 113, ficou estabelecido que:

"113 - Sábado do bancário - Não- incidência de horas extras.

O sábado do bancário é dia útil não trabalhado e não de repouso remunerado, não cabendo assim a repercussão do pagamento de horas extras habituais sobre sua remuneração".

Ressalta-se, entretanto, que o RSR do bancário tem as mesmas garantias de qualquer empregado, apenas com a diferença de que por não haver previsão legal de trabalho no sábado, não poderá sofrer desconto desse dia se não tiver cumprido integralmente a jornada semanal.

Na hipótese de o bancário não ter cumprido a jornada integral, sofrerá, somente, o desconto do domingo e feriado da mesma semana, se houver.

Quanto ao Enunciado 113 supratranscrito, convém verificar o documento coletivo de trabalho da respectiva categoria profissional, a fim de certificar-se existência de eventual posicionamento contrário ao apresentado.

15. Jornalista Profissional

No tocante ao RSR do jornalista profissional, a CLT prevê, em seu art. 307, o seguinte:

"Art. 307 - A cada 6 (seis) dias de trabalho efetivo corresponderá 1 (um) dia de descanso obrigatório, que coincidirá com o domingo, salvo acordo escrito em contrário, no qual será expressamente estipulado o dia em que se deve verificar o descanso".

16. Feriado no Domingo

Quando o feriado for comemorado no domingo, (ou dia de repouso durante a semana para os que trabalham em regime de escala de revezamento), o pagamento do repouso corresponderá a um só dia, não sendo cumulativas as remunerações (Decreto nº 27.048/49, art. 11, §3º).

17. Penalidades

O descumprimento do disposto nos arts. 67 a 70 da CLT, que tratam do RSR e algumas de suas implicações trabalhistas, sujeita o infrator à multa de, no mínimo, 37,8285 e, no máximo, 3.782,8472 Unidades Fiscais de Referência (UFIR), aplicada segundo a natureza da infração, sua extensão e a intenção de quem a praticou, aplicada em dobro no caso de reincidência e oposição à fiscalização ou desacato à autoridade, conforme art. 75 da CLT combinado com a Portaria MTb nº 290/97.

18. Fundamentos Legais

Mencionados no texto.


Dra. Líris Silvia Zoega Tognoli do Amaral
Consultora FISCOSoft On Line
É Advogada; Pós-graduada em Direito do Trabalho e Previdência Social; Experiência de mais de 13 anos nas áreas de direito do trabalho, previdenciário e FGTS.
E-mail: liris@fiscosoft.com.br
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Este Comentário, publicado em 30/09/2003, foi produzido pela equipe técnica da FISCOSoft. É proibida sua reprodução para fins comerciais, sem permissão expressa da Editora, bem assim sua publicação em qualquer mídia, sem menção à fonte (FISCOSoft www.fiscosoft.com.br). Os infratores estão sujeitos às penas da Lei nº 9.610/98, que rege os direitos autorais no Brasil.

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Trabalhista -> A dignidade e consciência do empregado frente aos interesses patrimoniais e comerciais da empresa - Fonte: FiscoSoft

Artigo - Federal - 2003/0522

A dignidade e consciência do empregado frente aos interesses patrimoniais e comerciais da empresa
Mario Antonio Lobato de Paiva*

I-Intróito

O presente artigo traz a baila a consciência e a dignidade da pessoa humana, ressaltando que na relação empregatícia não é possível a redução do empregado à condição de mero objeto do empregador. Veda-se a coisificação da pessoa. A abordagem do tema passa pela análise conflitante de dois aspectos: A dignidade e consciência do trabalhador e os interesses patrimoniais e comerciais da empresa.

Tomamos conhecimento em virtude do envio de cópia da sentença por um dos julgadores Dr. Rodolfo Capón Filas de que em recente decisão a Corte Argentina por meio de seus julgadores teve a oportunidade de analisar a questão envolvendo estes dois interesses e a partir desta decisão resolvemos confeccionar este ensaio.

II- Caso Concreto

Em seu arrazoado o trabalhador argentino invoca uma questão de consciência para negar-se a atender a um passageiro de empresa aérea da Argentina integrante da ditadura militar daquele país pois havia necessidade, segundo ele de preservar sua personalidade e dignidade que ficariam extremamente abaladas se sua atitude fosse outra, solicitando, ainda que este seja dispensado de cumprir com a obrigação laboral de sua relação empregatícia.

II.a- Voto do Juiz La Fuente

O voto do juiz argentino Dr. La Fuente vem argumentando que o trabalhador poderia perfeitamente preservar sua consciência e princípios sem afetar os interesses do empregador, desde que se dirija a um colega de trabalho para que atenda o passageiro ou a um superior que determine tal ato ou que decida por questão de consciência se pode ou não atende-lo porém não poderia deixar de fornecer o atendimento correspondente a qualquer cliente.

Assim defende o juiz Fuente que o trabalhador tem o legítimo direito de negar-se a atender pessoalmente a um passageiro que repudia, porém o que não pode fazer por uma razão elementar de boa-fé e lealdade com a empresa é negar sem alternativa a admissão do passageiro, seja quem seja, que tenha contratado com sua empregadora.

Conclui, então o referido juiz em seu voto pela procedência das alegações da empresa que se sente prejudicada uma vez que, o empregado, que a representava, decidiu unilateralmente opor-se a entrada de um passageiro legitimado a viajar sem dar nenhuma alternativa nem indicação, afetando a prestação do serviço e a imagem pública da empresa, revestindo-se esta atitude em um incumprimento dos deveres de seu cargo o que justificaria a aplicação de uma sanção.

II.b- Voto do Juiz Rodolfo Capón Filas

Segundo o voto do juiz Capón Filas o principal papel do juiz reside em sua independência para velar pelas liberdades públicas e acrescentar respeito aos direitos humanos, uma vez que o Poder Judicial tem o compromisso histórico e moral com a preservação da dignidade do homem. Este compromisso judicial tem em sus raízes normatizadas a partir da diretiva constitucional expressada no artigo 14 da Constituição vigente na Argentina.

Assim, todo o homem, por razões de liberdade de consciência tem o direito a não empunhar as armas para matar, sendo reconhecido em seu país pela lei 24429 (BO 10-01-95). Em matéria laboral, o contido na objeção alcança a toda a conduta empresarial que tenha, direta ou indiretamente a violar direitos humanos ou in/cumprindo-os no curso da ação.

Recorda-se em seu voto episódio assemelhado a este quando durante a ditadura militar Argentina, um maleiro de um hotel parisiense se negou a levar as malas de um ditador. Ante isso foi despedido. O Tribunal de Paris considerou injusta a demissão e ordenou a reintegração do trabalhador despedido, com o argumento de que um país livre como a França os ditadores não devem ser atendidos. Asseverando que dada a globalização, este fato é digno procedente para confirmar a sentença recorrida que determinou a anulação da sanção imposta pela empresa ao empregado.

III- Direitos Humanos Naturais

O caso epígrafe merece ser analisado a luz de direitos essenciais para o normal convívio social. Referida decisão nos faz repensar e discutir direitos bem mais importantes como por exemplo os direitos humanos naturais e os direitos fundamentais, e que por isso devem ser respeitados pelas partes integrantes de uma relação de emprego. Portanto para obtermos um posicionamento mais justo sobre o assunto, deveremos adentrar e conhecer melhor tais direitos essenciais para o ser humano.

Os direito humanos são direitos naturais a qualquer homem por serem absolutos, imutáveis e intemporais. Dizem respeito ao que predica o homem ontologicamente, e revelam-se como fundantes dos direitos individuais.

Espacialmente são tido como válidos para todos os povos, independentemente de ratificações bilaterais.

Em caso de antinomia entre eles e os dispositivos de direito interno, a exegese deve lhes ser favorável, do que resulta verdadeiro estado de subordinação entre os respectivos conceitos.

Segundo a tradição ocidental, eles manifestar-se-iam, dentre outros, nas liberdades de crença (Lutero), de consciência (Espinosa), de propriedade (Locke) e de pensamento (Kant).

Segundo Lutero(1), a vida religiosa se torna reflexiva: na solidão da religião da subjetividade, o mundo divino se transforma em algo posto pela própria interioridade. O protestantismo afirma a soberania de um sujeito que preserva nas próprias convicções, fazendo-as valer contra a autoridade de revelação e tradição.

Espinosa(2) define a liberdade pela potência interna de agir como dotada de força maior do que a potência da ação externa. Para que a liberdade se exerça não se trata de contar com a ausência de constrangimentos ou de empecilhos, nem de confundi-la com um querer cego, mas de desenvolver internamente uma força não só capaz de remover obstáculos (que sempre existirão), mas também capaz de interpretar o significado do próprio obstáculo, sem o que jamais se poderá enfrenta-lo.

Para Locke(3), na sociedade de mercado onde impera o " individualismo possessivo: "1" uomo è uomo soltanto nella misura in cui è proprietário di sé; la sua umanità dipende dalla sua libertà di stabilire com sui simili rappoti contrattuali basati sul suo poprio interesse, la sua società consiste in una serie di rapporti commerciali' (MACPHERSON, The political theory of possessive individualism). In questa società, quindi, nella quale l'uomo diventa persona solo in quanto è proprietario esclusivo di sé e dei suoi beni, nella quale, cioè, tutti i valori morali e giuridici si convertono automaticamente in valori di mercato la proprietà privata e il contrato sono destinati a funcionare come le categoie a priori del sisema giuridico, considrato sai come totalità, sai nelle sue particolari dimensioni pubbliche e private. In essa, cioè, come há nitidamente Locke, 'l' una e altra categoria non solo constituiscono l'intero contenuto delle libertà individuali e dei rapporti iterprivati, ma formano pure la base essenzil e imprescindibile dell società della sovranità".

Para Kant(4), a saída o homem da "menoridade"(segundo ele, a "menoridade é a incapacidade de se servir do entendimento sem orientação de outrem) mediante o uso livre e público do pensamento é, frente ao jugo dos dogmas da tradição, uma necessidade imprescindível para o desenvolvimento e a emancipação do homem. ("Sapare aude! Tenha coragem de te servires do teu próprio entendimento! Eis a palavra de ordem do iluminismo.").

Assim podemos perceber que a atitude tomada pelo empregado ao se recusar em prestar serviço que fere sua dignidade, liberdade e consciência não constitui nenhuma falta grave que enseje punição disciplinar por parte do empregador, já que fundado nos direitos humanos naturais que prevalecem sobre qualquer legislação. Louva-se assim a atitude corajosa do trabalhador de servir-se de seu próprio entendimento sobrepondo seu conceito de valor moral em detrimento ao valor de mercado buscado pela empresa; liberdade pela potência interna de agir como dotada de força maior do que a potência da ação externa; a soberania de um sujeito que preserva nas próprias convicções, fazendo-as valer contra a autoridade de revelação e tradição. Sendo assim, o empregado tem o legítimo direito humano natural de recusar-se a prestar qualquer serviço ao empregador se este ferir a consciência e dignidade do empregado.

IV- Direitos Humanos positivados nas Declaração universais

Fruto do Iluminismo e da Revolução Francesa, a necessidade de codificar o rol de prerrogativas e direitos que o Homem poderia opor, de maneira absoluta, perante os outros homens, surge como meio de demonstrar, materialmente de modo inexorável, que os privilégios de foro hereditário que imperavam no regime feudal haviam terminado."Com Aufklärung (Iluminismo) e a revolução francesa vem à luz a validação do princípio da liberdade da vontade como fundamento substancial do Estado, prevalecendo, sob a forma da Proclamação Universal dos Direitos do Homem e do Código de Napoleão, contra o direito historicamente herdado" (5).

Assim, os homens foram elevados, pela nova rainha, a lei, ao status de cidadãos iguais em direitos e em oportunidades.

Seu alto grau de abstração pode ser exemplificado pelo brado revolucionário: "Liberdade, igualdade e fraternidade".

No entanto, sua evolução conceitual sofreu modificações para, contemporaneamente, indicar, via Carta Universal de Direitos das Nações Unidas, o conjunto de faculdades e instituições que, em cada momento histórico, concretizam as exigências de respeito à dignidade humana. Compreendidas nestas, não só os requisitos inerentes ao desenvolvimento espiritual, mas também, aqueles fatores mínimos de sobrevivência física da pessoa, como a alimentação e o emprego.

Sem embargo de sua jurisdição estender-se a toda a humanidade, sem exceção de povo algum, eles dependem, para se aperfeiçoarem, da ratificação via ato unilateral que exprime, no plano internacional, a vontade do Estado signatário em obrigar-se a cumprir os ditames dos direitos das gentes.

Sua ratificação, mormente no que tange ao nosso tema, dá-lhes o status de verdadeiras leis internas restando, porém, em caso de conflito, subordinados à autoridade da Constituição, afirma que : "uma vez insculpidos determinados direitos ou garantias individuais num tratado internacional (ratificação pelo Brasil), esse texto passa a incorporar-se ao sistema jurídico estatal" (6).

V- Direitos fundamentais

Os Direitos fundamentais, ao seu tempo, são os contidos numa Constituição específica, positivada, isto é, são direitos que se encontram formalizados num quadro jurisdicional plenamente definido.

Eles possuem estreito nexo de interdependência genética e funcional num Estado de Direito concreto, "ya que el Estado de Derecho exige a implica para serlo garantizar los derechos fundamentales, mientras que éstos exigem e implican par su realización al Estado de Derecho" (7).

Assim, segundo Perez Luño, os Direitos Fundamentais determinariam:

"La propia significación del poder público, al existir una íntima relación entre o papel asignado a tales derechos y el modo de organizar y ejercer las funciones estatales. Los derechos fundamentales constituyen la principal garantía com que cuentan los cidadanos de un Estado de Derecho de que el sistema jurídico y político en su conjunto se orientará hacia el respeto y promoción de la persona humana; en su estricta dimensión individual (Estado liberal de Derecho), o conjugando ésta com la exigência de solidaridad corolario de la componente social y coletiva de la via humana (Estado social de Derecho) (8).

No nosso caso específico, eles estão estruturados no artigo 5º da Constituição Federal. Entretanto, eles não constituem "número clausus". (Ainda segundo Maria Garcia: "o regime a que alude o parágrafo 2º do artigo 5º compreende, no sistema atual, todo o quadro da estrutura estatal definida no artigoº 'A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito federal, constitui-se em Estado democrático de Direito (...)'. Nessa conformidade, os direitos e garantias referidos no parágrafo 2º do artigo 5º serão decorrentes (...) do regime republicano - que designa o governo da res publica e aperfeiçoa (...) os princípios mais caros à cidadania ( a vida, a segurança e a propriedade e a liberdade). E é em torno desses valores que se definem os direitos individuais (...) Os princípios, por sua vez, denotam origem, começo e sentido jurídico, as normas elementares de formação estrutural instituídos como base ou alicerce de um sistema. Dentre os princípios constitucionais, já elencados no mesmo artigo 1º - como um dos fundamentos da estado e da República - o princípio-direito de cidadania, devendo sofrer interpretação extensiva de modo a desdobrá-lo em novos aspectos ou mesmo em novos direitos perante a pressão das necessidades práticas de proteção jurídica dos particulares(9).

Porém, a iniciativa pioneira nesse manifestar é admitida como pertencente à Lei Fundamental de Bonn, de 23 de maio de 1949, responsável por solenizar, no seu art. 1.1., incisiva declaração: "A dignidade do homem é intangível. Os poderes públicos estão obrigados a respeitá-la e protegê-la". O preceito recolhe sua inspiração na Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas de 10 de dezembro de 1948, sem olvidar o respeito aos direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem, propugnados pelos revolucionários franceses através da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 26 de agosto de 1789(10).

O nosso constitucionalismo que, a partir de 1934, vem sofrendo forte influxo germânico, não ficou alheio ao tema (11). O Constituinte de 1988 deixou claro que o Estado Democrático de Direito que instituía tem, como fundamento, a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III).

VI- A Dignidade do trabalhador

A dignidade do homem é força que surge de sua natureza e se expande a todos os componentes da sociedade civil, sendo expressado na Carta Internacional de Direito Humanos, especialmente, na Declaração Universal dos Direitos Humanos (artigo1O.) e no Pacto Internacional dos direitos econômicos, sociais e culturais (artigo3). Também na Declaração Americana dos Direitos e deveres do Homem (preâmbulo).

Sempre, em todo o mundo conflitivo como o atual, importa a doutrina das Nações Unidas na Conferência Mundial de Direitos Humanos (Viena, 14 a 25 de junho de 1993):

"Todos os direito humanos tem sua origem na dignidade e no valor da pessoa humana. Esta é o sujeito central do direitos humanos e das liberdades fundamentais, pelo que se deve ser o principal beneficiário desses direitos e liberdades. Disso resulta "a responsabilidade de todos os Estados, de conformidade com a Carta das Nações Unidas, de fomentar e propiciar o respeito aos direito humanos e as liberdades fundamentais de todos, sem fazer distinção alguma por motivos de raça, sexo, indioma e religião, e criar condições básicas com as quais possam ante a justiça e o respeito as obrigações emanadas pelo tratados e outras fontes de direito internacional, promover o progresso social e elevar o nível de vida dentro de um conceito mas amplo da liberdade, praticar tolerância e conviver em paz como bons vizinhos e emplacar um mecanismo internacional para promover o progresso econômico e social de todos os povos" formas de discriminação e violência a que são expostas as mulheres em todo o mundo. Exige " que todos os povos do mundo e todos os Estados membros das nações Unidas empreendam com renovado impulso a tarefa global de promover e proteger todos os direito humanos e as liberdades fundamentais para garantir os desfrute pleno e universal desses direitos" ... " cada Estado deve prever um marco de recursos eficazes para reparar as infrações ou violações de direito humanos. A administração da justiça, em particular dos organismos encarregados de fazer cumprir a lei assim como o poder judicial e uma advocacia independentes em plena conformidade com as normas contidas nos instrumentos internacionais de direitos humanos, são de importância decisiva para a cabal realização dos direito humanos sem discriminação alguma que resultam indispensáveis aos processos de democratização e desenvolvimento sustentável" .

VII- O conteúdo do princípio da dignidade.

O postulado da dignidade humana, em virtude da forte carga de abstração que encerra, não tem alcançado, quanto ao campo de sua atuação objetiva, unanimidade entre os autores, muito embora se deva, de logo, ressaltar que as múltiplas opiniões se apresentam harmônicas e complementares.

Karl Larenz(12)., instado a pronunciar-se sobre o personalismo ético da pessoa no Direito Privado, reconhece na dignidade pessoal a prerrogativa de todo ser humano em ser respeitado como pessoa, de não ser prejudicado em sua existência (a vida, o corpo e a saúde) e de fruir de um âmbito existencial próprio.

Por sua vez, Ernesto Benda (13) aduz que a consagração, no art. 1.1. da Lei Fundamental tedesca, da dignidade humana como parâmetro valorativo, evoca, inicialmente, o condão de impedir a degradação do homem, em decorrência de sua conversão em mero objeto de ação estatal. Mas não é só. Igualmente, esgrime a afirmativa, de aceitação geral, de competir ao Estado a procura em propiciar ao indivíduo a garantia de sua existência material mínima.

Mais completo, Joaquín Arce y Flórez-Valdes(14) vislumbra no respeito à dignidade da pessoa humana quatro importantes conseqüências: a) igualdade de direitos entre todos os homens, uma vez integrarem a sociedade como pessoas e não como cidadãos; b) garantia da independência e autonomia do ser humano, de forma a obstar toda coação externa ao desenvolvimento de sua personalidade, bem como toda atuação que implique na sua degradação; c) observância e proteção dos direitos inalienáveis do homem; d) não admissibilidade da negativa dos meios fundamentais para o desenvolvimento de alguém como pessoa ou a imposição de condições subumanas de vida. Adverte, com carradas de acerto, que a tutela constitucional se volta em detrimento de violações não somente levadas a cabo pelo Estado, mas também pelos particulares.

Vistas essas posições, lícito proceder às suas conciliações mediante a decomposição alvitrada pelo último dos autores. É que este, ao desmembrar os diversos pontos de reflexo do princípio analisado, demais de encampar a opinião dos doutrinadores antes referidos, ampliou o raio de ação demarcado à dignidade da pessoa humana.

Com base na sistematização de Joaquín Arce y Flórez-Valdés, podemos, mediante as adaptações necessárias, revelar o substrato material da dignidade da pessoa humana em nossa ordem jurídica.

Disso resulta que a interferência do princípio se espraia, entre nós, nos seguintes pontos: a) reverência à igualdade entre os homens (art. 5º, I, CF); b) impedimento à consideração do ser humano como objeto, degradando-se a sua condição de pessoa, na limitação da autonomia da vontade e no respeito aos direitos da personalidade, entre os quais estão inseridas as restrições à manipulação genética do homem; c) garantia de um patamar existencial mínimo(15).

VIII- Conclusão

Nos pesos da balança, portanto foram colocados de uma lado a "dignidade e consciência do hiposuficiente" e no outro " os interesses patrimoniais e comerciais da empresa". Entendemos que a sanção imposta implica em exercício abusivo do poder disciplinar do empregador, pois sobre o objetivo comercio deve prevalecer o respeito a dignidade do trabalhador e conseqüente declaração da nulidade da sanção imposta.

Diante desta exposição concluímos que qualquer medida disciplinar que determine falta grave ao trabalhador em virtude da negativa do trabalhador de prestar seus serviços por motivos de preservação de sua dignidade consciência, deve ser considerada ilegal, pois apesar de o trabalhador descumprir uma de suas tarefas de seu cargo (e em um contexto Kelseniano, deveria ser sancionado), cabe frisar que as relações laborais se desenvolvem em um determinado marco histórico-político e que seus protagonistas (no caso o trabalhador) são pessoas e por isso devem ser respeitadas por quem exerce sobre elas o poder de direção. Em outras palavras: a respeitável atitude do hiposuficiente, ao negar-se por razões de princípios a atender a personagem público e notório ligado a história da ditadura da Argentina, deve compelir a empregadora a respeitar as razões invocadas pelo trabalhador.

A tutela do trabalho e do trabalhador se entrelaça com sua essência e com sua dignidade humana. A sociedade tutela o trabalhador porque é um ser digno e não porque este seja, como alguns dizem simples e modesto. De nenhuma maneira a subordinação jurídica do trabalhador em relação ao empregador pode ser interpretada como um menosprezo por sua natureza.

NOTAS

(1) GIOCOIA, Jr. Oswaldo. Nietzche e a Modernidade segundo Habermas. Idéias, Rev. do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp. Ano I, n 2, 1994. P. 16.

(2) CHAUI, Marilena de Souza - Direito Natural e Direito Civil em Hobbes e Espinosa. Revista Crítica do Direito. São Paulo. Livraria Editora Ciências Humanas, n 1, 1908 . p. 104.

(3) BALDASSARRE, Antonio - Privacy e Constituzione. L'esperienza statunitense. Roma. Bulzoni Editore. 1974 .p. 18.

(4) KANT, Immanuel. Resposta à Pergunta: Que é o Iluminismo. IN: A paz perpétua e outros opúsculos. Lisboa. Edições 70. 1988. P. 11-19.

(5) GIOCOIA. Jr. Oswaldo. Op. cit., p. 16.

(6) Cf. GARCIA, Maria. Desobediência Civil. Direito Fundamental. São Paulo. Ed. Revista dos Tribunais. 1994. P. 211

(7) LUÑO, Antonio e. Perez - Loz Derechos Fundamentales. Madrid. Tecnos. 1993. 5º Edição p. 19.

(8) Idem, ibidem. p. 20.

(9) GARCIA, Maria, op.cit., p. 211.

(10) É preciso deixar claro que o liberalismo não plasmara a concepção de que a dignidade da pessoa humana constituísse incumbência do Estado, até porque a felicidade do indivíduo estaria mais garantida quanto mais este estivesse imune à ação estatal. Isso explica o motivo pelo qual a idéia em foco ganhou maior relevância com o Estado Social, porque na sociedade moderna a pessoa depende, de maneira mais intensa, das prestações a cargo do Poder Público.

(11) PAULO BONAVIDES (Curso de direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 1993. p. 288, et seq) distingue, com clareza, três fases de nossa história constitucional: a) a primeira, influenciada nos modelos francês e inglês do Século XIX, teve sua realização com a Constituição de 1824; a segunda, inaugurada pela Constituição de 1891, representa uma aproximação com o exemplo norte-americano; a terceira, ainda em curso, baseia-se na presença dos traços inerentes ao perfil alemão do Século XX, cujo início fora marcado pela Constituição de 1934.

(12) Derecho civil: parte general. Madri: Editoriales de Derecho Reunidas, 1978. p. 46.

(13) Dignidad humana y derechos de la personalidad. In: BENDA, Ernesto et alii. Manual de derecho constitucional, Madri: Marcial Pons, 1996. p. 124-127.

(14) Los principios generales del Derecho y su formulación constitucional. Madri: Editorial Civitas, 1990. p. 149.

(15) Louvado na tradição doutrinária e jurisprudencial alemã, MANOEL AFONSO VAZ (Lei e reserva da lei; a causa da lei na constituição portuguesa de 1976. Porto: Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, 1992. 515p. Tese de Doutorado. p. 190) vislumbra na dignidade da pessoa humana a qualidade de princípio ético, de caráter hierarquicamente superior às normas constitucionais e, portanto, vinculativo do poder constituinte, de modo que qualquer regra positiva, ordinária ou constitucional, que lhe contrarie padece de ilegitimidade. Esse é, entre nós, o pensamento de EDUARDO TALAMINI (Dignidade humana, soberania popular e pena de morte. Revista Trimestral de Direito Público, São Paulo, n. 11, p. 178-195. 1995), ao defender a impossibilidade, em face da consideração da dignidade da pessoa humana como valor suprapositivo, da instituição da pena de morte.




Mario Antonio Lobato de Paiva*
malp@interconect.com.br

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Trabalhista -> Uma Mudança Copérnica no Adicional de Insalubridade - Fonte: FiscoSoft

Artigo - Federal - 2003/0513

Uma Mudança Copérnica no Adicional de Insalubridade
João Alves de Almeida Neto*

PREÂMBULO

Assim como Nicolau Copérnico(1), devemos acreditar em nossas convicções e defendê-las. Enfrentando as forças conservadoras e implantando novos paradigmas.

O astrônomo polonês em destaque, sustentou que os astros do sistema solar não giravam em torno da Terra. Que a mesma não era o centro do universo. Asseverou ainda, que todos os astros do nosso sistema, incluindo o planeta terra, tinha como ponto centralizador o Sol. A sua teoria heliocêntrica ia de encontro à teoria geocêntrica, que se consubstanciava com os interesses das autoridades religiosas, já que para estas, a teoria de Ptolomeu era mais adequada para confirmar as citações bíblicas.

Mesmo temendo os perigos de contradizer os eclesiásticos, Copérnico expôs seu pensamento, quebrando dogmas já consolidados na sociedade. Devido a sua coragem, o mundo se modificou.

Nós, estudiosos do direito, temos como função social, o aperfeiçoamento da Ciência jurídica. Se para isso tivermos que quebrar paradigmas consolidados na jurisprudência, devemos fazer sem se amedrontar com as críticas.

INTRODUÇÃO

Em recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), no Recurso Extraordinário (RE.) nº 236396/MG, foi considerada inconstitucional, por unanimidade, a utilização do salário mínimo como referencial para o adicional de insalubridade (art. 7, IV da CF/88).

Sendo o STF a corte suprema no Brasil, quando o mesmo se posicionar sobre alguma matéria, os demais órgãos da estrutura judiciária devem seguí-lo revendo seus entendimentos, que o contrariem.

Apesar do STF já ter reiterado seu posicionado sobre o assunto, o TST continua a utilizar o salário mínimo como base para o referido adicional, adotando o art. 192 da CLT e suas súmulas.

Diante do exposto passemos a fundamentar o nosso posicionamento sobre a nova base de cálculo do adicional de insalubridade. Veremos a qual desses TITÃS consiste razão.

ADCIONAL DE INSALUBRIDADE

Adicional, no sentido comum, significa algo que se acresce. No sentido jurídico, o mesmo é um acréscimo à remuneração devido à labuta em condições mais gravosas. A remuneração sofre influência das condições em que o trabalho é prestado. Adam Smith já asseverava que os salários variam de acordo com a facilidade ou dificuldade, limpeza ou sujeira, dignidade ou indignidade do emprego. Desta forma, a remuneração é majorada pelos adicionais ao se verificar existência das supraditas condições. Os adicionais são estabelecidos em contratos coletivos (fringes benefis) ou em leis (adicionais compulsórios).

Devem conjugar as funções retributiva (contraprestação obrigacional pela energia posta à disposição do empregador), indenizatória (compensação pelos prejuízos que as condições de trabalho causam ao empregados) e punitiva (sancionar os empregadores por oferecerem condições de trabalho lesivas).

Os adicionais em destaque, se bifurcam em dois tipos: os de dano e os de risco. Os adicionais de danos são decorrentes da prestação de trabalho que impõe um dano efetivo ao empregado, seja físico, psíquico ou social (adicionais por horas extras, por trabalho noturno, por transferência de localidade). Já os adicionais de risco são atrelados às atividades, as quais a prestação em si não causa dano algum, porém expõe o empregador a perigo concreto de vir a sentí-lo (adicionais de insalubridade, periculosidade e de penosidade) (2). Eles são devidos com a simples exposição ao dano, não sendo necessária a sua ocorrência.

O adicional de insalubridade, objeto de nosso estudo, é devido aos trabalhadores que prestam serviços em condições insalubres. A CLT conceitua, em seu art. 189, o que sejam atividades insalubres.

atividades ou operações que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites legais, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade dos agentes, do tempo máximo de exposição do empregado a esses agentes.

Entretanto, o legislador delegou competência ao Ministério do Trabalho (MTb), para que o mesmo aprove o quadro das atividades de operações insalubres (art. 190, caput, da CLT). Sendo assim, somente as atividades descritas no referido quadro podem ensejar o adicional de insalubridade(3).

José Luiz Ferreira Prunes(4), em sua obra clássica sobre a insalubridade, ensina que existem quatro fatores que influenciam no grau de insalubridade. A depender das suas combinações, a escala de intensidade da insalubridade poderá variar entre os percentuais de 10%, 20% ou 40% (mínima, media, máxima respectivamente), sendo determinado em laudo pericial pelo Medico com especialização em medicina e higiene do trabalho. Os quatro elementos são: físico (v.g. temperatura excessiva, umidade,pressão); químico (v.g. metais ou metalóides venenosos, fumaça, vapor); biológico (v.g. portadores de doenças contagiosas); psicológico (condições de trabalho, tensão espiritual).

UM BOSQUEJO HISTÓRICO ATÉ A MUDANÇA COPÉRNICA.

Com a promulgação da CF/88 inúmeros foram os debates travados entre doutrinadores trabalhistas acerca da constitucionalidade do art. 192 da CLT. Este estabelece que o adicional de insalubridade deveria ter como base o salário mínimo, indo de encontro à vedação constitucional à vinculação do salário mínimo para qualquer fim (art. 7º, IV, CF/88).

O TST, buscando pacificar e uniformizar a jurisprudência, editou a orientação jurisprudencial (OJ) nº 2 da seção de dissídios individuais (SDI), a qual defendia a tese que a base de cálculo do adicional de insalubridade continuaria a ser o salário mínimo mesmo após o advento da CF/88. Asseveravam que a intenção do constituinte originário ao produzir esta norma, foi impedir que o salário mínimo servisse de indexação, evitando com isso a inflação(5). Entendendo que o art. 192 da CLT foi recepcionado pela atual Carta Magna, já que a mesma não proíbe a utilização do referido salário como base de incidência.

Entretanto anos após a edição da OJ nº 02 da SDI, a celeuma chegou ao STF. O RE 236396/MP, cujo Relator foi Ministro Sepúlveda Pertence, dirimiu a dúvida latente. Serviu de lind case, para as demais decisões sobre a mesma matéria no STF.

Nada obstante o STF já ter se pronunciado sobre o assunto, os TRTs e TST continuaram a utilizar, como referência para o cálculo de insalubridade, o salário mínimo. Ferindo a hierarquia existente na organização judiciária.

Em recente decisão no TST(6), o Ministro Ives Gandra, afirmou que o Supremo teria julgado inconstitucional a regra celetista, mas não a teria anulado, "tendo em vista o caos jurídico que o vazio legislativo ocasionaria". Ponderou que se "a conseqüência da declaração da inconstitucionalidade dos mesmos é a negativa de sua aplicação, teríamos temporariamente (até que a nova lei fosse promulgada) suprimidos a parcela salarial em tela e o instituto da alçada no Direito do Trabalho, o que na prática, é infinitamente mais prejudicial ao trabalhador e à sociedade do que a vinculação desses institutos ao reajuste de acordo com o salário mínimo". Ainda propôs "a conversão do salário mínimo em sua expressão monetária à época do direito postulado, aplicando-se os reajustes legais que, naturalmente, foram em percentuais inferiores ao reajustamento do salário mínimo", como solução do conflito em destaque.

Continua, portanto, sem resposta para a pergunta: adotar ou não adotar o salário mínimo como base para o adicional de insalubridade? Eis a questão!

NOSSO POSICIONAMENTO!

Se pararmos para observar, o adicional de insalubridade revela um alto grau de anacronismo da legislação do trabalho. Ao legitimar o trabalho em condições de agressão à saúde, mediante pagamento de adicionais variáveis, o legislador conferiu aparência de legalidade à relações de "compra e venda" da saúde dos empregadores, patrimônio verdadeiramente inalienável, cuja proteção constitui dever fundamental do Estado brasileiro (art. 1º, III, 5º, III, e 196, todos da CF). Pior que isso, ao adotar o salário mínimo como referência para o cálculo do supracitado adicional, ele incentivou o empregador a lesionar mais ainda a saúde do profissional. Já que será mais dispendioso para o empregador buscar meios e métodos de eliminar ou reduzir a insalubridade nas suas atividades, do que pagar o adicional de insalubridade.

A adoção do salário mínimo como base para o adicional em questão, fere o princípio da isonomia, bem como impede que este instituto trabalhista exerça suas funções.

Não exerce sua função sancionadora, já que o valor pago pela empresa é diminuto. A política legislativa deveria se voltar à supressão da insalubridade nas atividades profissionais, com a imposição de pesadas sanções administrativas e tributárias, bem como a mudança da fonte de incidência do adicional de insalubridade. Não sendo mais admissível, com os atuais avanços científicos e tecnológicos, a atitude de descaso das maiorias das empresas brasileira com a saúde de seus empregados.

Fere o princípio da isonomia substancial. O adicional de periculosidade se assemelha ao de insalubridade. Ambos são adicionais de risco, encorparam à remuneração, possuem as mesmas funções, ou seja, remunerar, compensar e indenizar, e estão relacionados a bens indisponíveis do mais alto valor (a vida e a saúde). Diferenciam-se apenas pela duração dos seus efeitos. A insalubridade é insidiosa e lenta nos resultados, enquanto o risco provocado pela periculosidade é impactuante e instantâneo, quando se consuma.Sendo tão semelhante, não deveriam se expressar em valores monetários tão diferentes.

Se já não bastassem os motivos expostos para a mudança da base de cálculo do instituto estudado, o advento do art 7, IV da CF/88 veio decretar a sua morte. Derrogando o art. 192 da CLT.

Os mais apressados iriam dizer:

Está vendo, o Ministro Ives Gandra está certo! A vedação da utilização do salário mínimo vai suprimir, temporariamente (até que a nova lei fosse promulgada), a parcela salarial em tela e o instituto da alçada no Direito do Trabalho, o que na prática, é infinitamente mais prejudicial ao trabalhador e à sociedade do que a vinculação desses institutos ao reajuste de acordo com o salário mínimo.

Afirmariam ainda:

A declaração de inconstitucionalidade em tela iriam ferir direitos fundamentais encartados nos incisos XXIII do art. 7º e no § 1º do art. 5º, que reconhecem o direito ao adicional na situação do labor insalutífero, bem como a aplicabilidade imediata das normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais. Deve-se, portanto, tentar conformar as normas constitucionais supracitadas. Evitando com isso o conflito entre normas constitucionais, o que geraria normas constitucionais inconstitucionais (Teoria de Otto Bacoff. Teoria esta, não adotada pelo nosso sistema jurídico).

A solução mais adequada é continuar utilizando base de incidência disposta no art. 192 da CLT até o surgimento de outra norma legal regulando a matéria (LICC, art. 2º, 1º).

Acreditamos que os apressados se equivocaram por dois motivos. Por não conhecer os princípios do direito do trabalho e suas fontes. Não queremos ser maniqueístas, exigimos conhecimentos basilares do direito.

A impossibilidade em adotar o salário mínimo como referência ao cálculo do adicional analisado, com o advento do art 7, IV da CF/88, não vai suprimir, nem temporariamente, a parcela salarial em questão.

Irritados com a nossa afirmação anterior, os mesmos apressados, iriam questionar:

Então, como é que vocês resolveriam esta questão?

Responderíamos com tranqüilidade:

Fácil.

Com a derrogação do art. 192 da CLT, pelo art. 7, IV da CF/88, aparentemente surgiu uma lacuna no ordenamento trabalhista. Todavia, a lacuna é apenas aparente.

Vocês lembram que a CLT, não tem como característica a completude e que o ordenamento jurídico não possuem lacunas?

Irritadíssimos, diriam:

-Sim. Onde vocês querem chegar?

Finalmente asseveraríamos:

Quero reavivar em suas mentes o artigo 8º da CLT que reza que "as autoridades administrativas, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela (....) analogia, (...)".

Analogicamente poderíamos, utilizar uma disposição legal que regula situação semelhante (art. 193, §1º da CLT) e aplicar ao adicional de insalubridade.

O §1º, do art. 193 regulamenta a base de cálculo do adicional de periculosidade. Sendo este instituto, um instituto jurídico com um alto grau de semelhança com o adicional de insalubridade (ambos vem compensar o labor em condições adversas), aplicaríamos para suprir a parte derrogada do art. 192 da CLT.

"§ 1º. O trabalho em condições de periculosidade assegura ao empregado um adicional de 30%(trinta por cento) sobre o salário sem acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participação nos lucros da empresa" (grifos nossos)

Desta forma, o art. 7º, IV não entraria em contradição com os direitos fundamentais encartado nos incisos XXIII do art. 7º e no § 1º do art. 5º. Não necessitando relativizá-los.

-Com esta solução, estaríamos materializando o princípio da isonomia e evitando maiores complicações até a criação de um novo dispositivo regulando a matéria (LICC, art. 2º, § 1º).

Salientaríamos ainda:

O nosso posicionamento coaduna com os valores cristalizados nos princípios do Direito do trabalho. Caso os críticos da analogia legis supradita (fundada na aplicação de lei existente a hipótese semelhante não regulada por lei alguma), impugnem esta solução, poderíamos integrar aplicando a analogia juris (fundada na aplicação de princípios informativos de todo o complexo jurídico à hipótese que apresenta motivação semelhante).

Segundo Américo Plá Rodriguez, o princípio da proteção ao hipossuficiente econômico, peculiar e estrutural do ramo trabalhista, trifurca nos princípios do in dúbio pro misero, da aplicação da norma mais favorável e a da observância da condição mais benéfica.

Diante do exposto devemos adotar a analogia juris, utilizando o princípio da aplicação da norma mais benéfica como fundamento para o uso do art. 193,§1º, caso entendam inaplicável a analogia legal.

LINHAS CONCLUSIVAS

Nós como juristas devemos ter consciência do nosso papel na sociedade. O Direito, como fenômeno social reflexivo, condiciona e é condicionado pela sociedade.

A questão em tela não se limita a legalidade, que ao nosso sentir, não existe outra solução mais adequada que a explanada no decorrer do texto. Busca também a construção do justo. Tarefa esta, que não está apenas nas mãos dos juizes - "principais criadores do direito, voz final da autoridade" nos dizeres de Mauro Cappelletti -, como também, nas mãos dos demais causídicos. Estes devem confiar em seu poder e insistir na defesa de suas convicções. Se a aplicação do salário contratual como nova base do adicional de insalubridade não for suficiente para impedir o trabalho em condições de agressão à saúde, pelo menos poderá, aliadas às outras providências já citadas, conduzir à minimização, representando um passo no processo de conscientização social acerca da necessidade de prestigiar a tutela da saúde e da dignidade dos trabalhadores.

Mesmo que percamos uma batalha, mas com a união de todos, poderemos, ao final, vencer a guerra. Apesar dos TRTs e TST continuarem a adotar o salário mínimo com base do adicional de insalubridade, devemos ter a coragem de Nicolau Copérnico ao sustentar seus entendimentos, que contrariavam as citações eclesiásticas. Ele mudou a base de uma teoria, quebrou um dogma consolidado. Podemos fazer o mesmo!

REFERENCIAS BIBLIOGRÀFICAS

PINTO, José Rodrigues. Curso de direito individual do trabalho: noções fundamentais de direito do trabalho, sujeitos e instituições. 3º ed. São Paulo: LTr, 1997.

PRUNES, José Luiz Ferreira. Insalubridade e periculosidade no trabalho: problemas e soluções. São Paulo: LTr. 1974.

NOTAS

(1) Nicolau Copérnico: Matemático e astrônomo polonês, autor da Teoria Heliocêntrica, segundo a qual o sol é o verdadeiro centro do sistema solar

(2) PINTO, José Rodrigues. Curso de direito individual do trabalho: noções fundamentais de direito do trabalho, sujeitos e instituições. 3º ed. São Paulo: LTr, 1997, p. 348.

(3) O MTb utiliza os critérios quantitativo - que analisa a intensidade do agente e o tempo de exposição aos seus efeitos- e qualitativo - que analisa em função do agente biológico ou químico que é tido como agressivo pelo MTb - para adotar a atividade como insalubre ou não. O fato da atividade do reclamante não estar incluída entre aquelas previstas como insalubre no quadro elaborado pelo MTb desobriga o empregador ao pagamento do adicional, por força do art. 195 da CLT, mesmo quando constatada pela perícia a existência de agente prejudicial n ambiente de trabalho do obreiro. Questão já pacifica na jurisprudência

(4) PRUNES, José Luiz Ferreira. Insalubridade e periculosidade no trabalho: problemas e soluções. São Paulo: LTr. 1974, p. 19.

(5) Análise feita adotando uma interpretação sistemática e teleológica.

(6) A-RR Número: 395 ANO: 1999 PROC. Nº TST-A-RR-395/1999-131-17-00.8




João Alves de Almeida Neto*
johnalmeidaneto@bol.com.br



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Trabalhista -> Da suspensão e interrupção do contrato de trabalho - Fonte: FiscoSoft

Artigo - Previdenciário/Trabalhista - 2003/0132

Da suspensão e interrupção do contrato de trabalho
Gleibe Pretti*

O contrato de trabalho poderá, conforme artigos 471 a 476-A, ser suspenso ou interrompido diante de acontecimentos supervenientes que, por ventura, ocorrem na prestação laboral.

Para a maioria dos autores quando há a necessidade de pagamento de salários pelo empregador configura-se em interrupção e quando não há necessidade do pagamento seria a suspensão.

A CLT por ser uma norma protetiva do trabalhador, visa atender as necessidades no pacto firmado entre o empregador e empregado e assegura, em caso de afastamento do emprego, as mesmas garantias que tinha antes de sair.

Caso o afastamento seja por motivo de serviço militar ou serviço público, como mesário, o contrato laboral não será alterado. Mas o empregado tem a obrigação de informar o empregador de sua intenção de voltar ao cargo de origem tendo em vista o trabalho público. O prazo será de 30 dias contados da data fim do trabalho.

Na ocasião de contrato de trabalho determinado, em caso de afastamento do trabalhador, após acordo entre as partes, esse tempo não será computado.

Em se tratando de afastamento, por parte da autoridade competente, em interesse a segurança nacional, não será configurada rescisão contratual. Essa solicitação será feita diretamente ao empregador, fundamentando sua decisão, com audiência da Procuradoria Regional do Trabalho, que providenciará a instauração do inquérito administrativo. Neste ínterim, o empregado irá receber seus vencimentos num prazo de 90 dias.

Existem algumas hipóteses taxativas de interrupção elencadas no artigo 473 em que o empregado deixará de comparecer no trabalho, sem prejuízo aos seus vencimentos, são elas:

Art.473 - O empregado poderá deixar de comparecer ao serviço sem prejuízo do salário:

I - até 2 (dois) dias consecutivos, em caso de falecimento do cônjuge, ascendente, descendente, irmão ou pessoa que, declarada em sua Carteira de Trabalho e Previdência Social, viva sob sua dependência econômica;

II - até 3 (três) dias consecutivos, em virtude de casamento;

III - por 1 (um) dia, em caso de nascimento de filho, no decorrer da primeira semana;

IV - por 1 (um) dia, em cada 12 (doze) meses de trabalho, em caso de doação voluntária de sangue devidamente comprovada;

V - até 2 (dois) dias consecutivos ou não, para o fim de se alistar eleitor, nos termos da lei respectiva;

VI - no período de tempo em que tiver de cumprir as exigências do Serviço Militar referidas na letra c do art. 65 da Lei nº 4.375, de 17 de agosto de 1964 (Lei do Serviço Militar);

VII - nos dias em que estiver comprovadamente realizando provas de exame vestibular para ingresso em estabelecimento de ensino superior.

Obs.:Inciso VII acrescentado pela Lei nº 9.471, de 14 de julho de 1997.

A lei vem garantir os direitos básicos aos trabalhadores para evitar abusos por parte do empregador e desta forma o artigo aponta com precisão os casos fáticos que serão permitidos.

A suspensão tem um limite de 30 dias, no máximo, acima disso ocorrerá a rescisão injusta do contrato de trabalho.

Em caso de aposentadoria por invalidez o contrato de trabalho será suspenso até o início do recebimento do benefício. Em caso de cancelamento da aposentadoria o empregador poderá optar em acolher o empregado na mesma função quando se aposentou ou rescindir o contrato consoante o artigo 477. Caso tenha estabilidade, deverá ser indenizado, consoante o artigo 497, indenização essa que não será paga pelo empregador quando este substituiu o empregado.

Em caso de doença o empregado é considerado em licença não remunerada, durante o prazo desse benefício.

O artigo 476-A, oriundo da MP nº 2.164-41 de 24/08/01, trouxe uma novidade no que tange a suspensão do contrato de trabalho, nos casos de cursos ou programa de qualificação profissional, onde descreve:

Art.476-A - O contrato de trabalho poderá ser suspenso, por um período de dois a cinco meses, para participação do empregado em curso ou programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador, com duração equivalente à suspensão contratual, mediante previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho e aquiescência formal do empregado, observado o disposto no art. 471 desta Consolidação.

§ 1º - Após a autorização concedida por intermédio de convenção ou acordo coletivo, o empregador deverá notificar o respectivo sindicato, com antecedência mínima de quinze dias da suspensão contratual.

§ 2º - O contrato de trabalho não poderá ser suspenso em conformidade com o disposto no caput deste artigo mais de uma vez no período de dezesseis meses.

§ 3º - O empregador poderá conceder ao empregado ajuda compensatória mensal, sem natureza salarial, durante o período de suspensão contratual nos termos do caput deste artigo, com valor a ser definido em convenções ou acordo coletivo.

§ 4º - Durante o período de suspensão contratual para participação em curso ou programa de qualificação profissional, o empregado fará jus aos benefícios voluntariamente concedidos pelo empregador.

§ 5º - Se ocorrer a dispensa do empregado no transcurso do período de suspensão contratual ou nos três meses subseqüentes ao seu retorno ao trabalho, o empregador pagará ao empregado, além das parcelas indenizatórias previstas na legislação em vigor, multa a ser estabelecida em convenção ou acordo coletivo, sendo de, no mínimo, cem por cento sobre o valor da última remuneração mensal anterior à suspensão do contrato.

§ 6º - Se durante a suspensão do contrato não for ministrado o curso ou programa de qualificação profissional, ou o empregado permanecer trabalhando para o empregador, ficará descaracterizada a suspensão, sujeitando o empregador ao pagamento imediato dos salários e dos encargos sociais referentes ao período, às penalidades cabíveis previstas na legislação em vigor, bem como as sanções previstas em convenção ou acordo coletivo.

Assim, a suspensão e interrupção são institutos do direito do trabalho de extrema importância tendo em vista os fatos novos que podem ocorrer no contrato de trabalho e os direitos garantidos, necessariamente, deverão ser assegurados.




Gleibe Pretti*
gleibe@est.oabsp.org.br


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Contabilidade -> Sociedades Cooperativas de Prestação de Serviços Médicos - Fonte: FiscoSoft

Artigo - Federal - 2003/0529

Sociedades Cooperativas de Prestação de Serviços Médicos - Conceito de Ato Cooperativo - Parecer.
Ives Gandra da Silva Martins*

C O N S U L T A

Formula-me, a consulente, as seguintes questões:

"SOCIEDADE COOPERATIVA

I- CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

A Confederação Estadual das Cooperativas Médicas, constituída de acordo com o artigo 6º, inciso III, da Lei Federal n. 5.764/71 (Lei das Sociedades Cooperativas), conforme seu estatuto social, tem (art.1º):

a) Sede e Administração em São Paulo, Estado de São Paulo;

b) Foro Jurídico na Comarca de São Paulo;

c) Área de ação circunscrita ao Estado de São Paulo;

d) Prazo de duração indeterminado;

e) Ano Social com término no dia 31 de dezembro de cada ano.

A Confederação tem por objetivo a integração, orientação e coordenação das entidades do Estado de São Paulo, tendo competência para atuar nas atividades de sua área de ação, especialmente nos empreendimentos que transcendam a capacidade ou conveniência da atuação das federações e das cooperativas singulares associadas, organizando programas de intercâmbio de serviços, de interesses e informações (artigo 2º).

No cumprimento de suas finalidades, a Confederação manterá e colocará à disposição de suas associadas, serviços de assessoria e planejamento, com o intuito de fixar uma orientação sistemática nas matérias que determinem posicionamento harmônico do cooperativismo médico, no âmbito estadual (§1º).

Todas as atividades da Confederação serão direcionadas para a integração da atividade das cooperativas associadas, competindo-lhe estimular e orientar a implantação de novas cooperativas de trabalho no âmbito estadual, tendo como meta a completude do sistema (§2º).

A confederação poderá negociar, coordenar e assinar contratos para a prestação de serviços, no âmbito de sua área de ação, com pessoas jurídicas de direito público ou privado, e instituir planos de saúde para pessoas físicas, obrigando-se em nome das cooperativas confederadas, tudo de modo a cumprir seu mister de congregação dos integrantes da profissão médica e de sua defesa econômico-social, proporcionando-lhes condições para o efetivo exercício de suas atividades (§ 3º).

Nos contratos celebrados, a Confederação representará as cooperadas coletivamente, agindo como instrumento (§ 4º).

Na hipótese do §3º, o contrato obrigará a totalidade do quadro social. Entretanto, caso se registrem discordâncias, as eventuais controvérsias serão submetidas à Assembléia Geral (§5º).

Compete à Confederação incentivar e difundir o cooperativismo (§ 6º).

As atividades hospitalares, laboratoriais e afins, quando indispensáveis para o pleno exercício profissional dos médicos cooperados das confederadas e, por conseqüência, do cumprimento dos contratos a que se refere o§ 3º deste artigo, serão colocadas à disposição destes, por intermédio da Confesp, integrando estas operações igualmente o ato cooperativo, na forma da lei, na condição de negócio auxiliar, tudo de modo a possibilitar a efetiva prestação do ato médico, como complementação das suas atividades de assistência médica (§ 7º).

A Confederação observará e pugnará para que a atividade cooperativa de trabalho médico observe o princípio da livre-escolha dentro dos respectivos quadros de associados, próprio do sistema de serviços executados através das cooperativas singulares e federações confederadas, como meio de aprimoramento à assistência médico-hospitalar (Art. 3º).

A Confederação estabelecerá, também, planos de assistência técnica, educacional e social, com a amplitude que os seus recursos financeiros próprios permitirem, nos termos do regulamento que será baixado para esse fim (Art.4º).

II- QUESITOS:

1.- Em face do regime jurídico próprio da Confederação do Estado de São Paulo, sociedade cooperativa de trabalho médico, aplica-se o princípio da dupla qualidade, isto porque o cooperado é associado e também usuário dos serviços prestados pela sociedade?

2.- Qual a distinção entre os fins da cooperativa

(finalidade) e seu objeto?

3.- Nos termos do artigo 146, III, 'c', da Constituição Federal qual deve ser a interpretação do "adequado tratamento tributário ao ato cooperativo" praticado pelas sociedades cooperativas de trabalho médico?

4.- O entendimento da Receita Federal sobre atos cooperativos e atos não cooperativos é restritivo, só entendendo por ato cooperativo aquele praticado pela cooperativa com o cooperado (interpretação literal do art. 79 da Lei 5.764/71), o que já está pacificado assim não ser, até pelo reconhecimento dos atos chamados auxiliares, referidos pela NBCT 10.21, do Conselho Federal de Contabilidade (aprovada pela Resolução CFC nº 944/02).

4.1- Esse entendimento está correto?

4.2- A entidade, cooperativa de trabalho médico, tem capacidade contributiva?

4.3- Em caso afirmativo, são tributáveis o ato cooperativo e o ato não cooperativo?

5.- Existe base de cálculo própria da cooperativa de trabalho médico em relação aos seguintes tributos:

a) Imposto de Renda da Pessoa Jurídica;

b) Imposto de Renda retido na fonte;

c) Contribuição para o Programa de Integração Social;

d) Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social;

e) Contribuição Social sobre o Lucro Líquido;

f) Imposto sobre Serviços de qualquer natureza, e

g) Lei Complementar n. 84/96, Lei 9.876/99 e Lei n. 10.666/03?

6.- A cooperativa de trabalho médico é sujeito passivo da obrigação tributária de recolhimento do Imposto de Renda Pessoa Jurídica?

7.- Há que se falar em faturamento de uma sociedade cooperativa de trabalho médico?

7.1- Em caso positivo, como ele pode ser identificado?

7.2- O PIS e COFINS são devidos pela cooperativa de trabalho médico?

7.3- As normas que tratam do PIS e COFINS, em relação às cooperativas, podem permanecer validamente no sistema do direito positivo brasileiro?

8.- No PIS e COFINS aplica-se a norma prevista pela NBCT 10.21, do Conselho Federal de Contabilidade (aprovada pela Resolução CFC nº 944/02)? Qual o fundamento de validade desta norma infra-legal?

9.- A quem compete o recolhimento do Imposto sobre a Renda retido na fonte decorrente dos contratos de prestação de serviços médico-hospitalares?

9.1 À empresa contratante ou à cooperativa de trabalho médico?

9.2 A cooperativa é fonte pagadora ou mera repassadora?

10.- Sobre as sobras líquidas apuradas pela cooperativa de trabalho médico deve incidir o imposto sobre a renda retido na fonte? "

R E S P O S T A

Diversas considerações fazem-se necessárias antes de responder às questões formuladas.

Algumas destas considerações decorrem da natureza dos problemas mencionados e outras de posicionamento doutrinário que, no correr destes últimos anos, tenho assumido sobre as cooperativas, o ato cooperativo e, principalmente, as cooperativas de serviços, em escritos, palestras e livros (1).

Uma observação preambular antes das demais considerações é que a lei 5764/71, embora cuide da valorização das cooperativas como dimensão da atividade econômica menos onerosa para a cidadania e propiciadora do desenvolvimento por suas variadas facetas, é ainda insuficiente para atender a nítida intenção constituinte de realçar o papel dessas entidades no cenário social e econômico.

Em dois dispositivos, entre outros, cristalinamente, o constituinte ofertou tratamento diferencial às cooperativas, ou seja, no aspecto econômico (174 § 2º) e no tributário (146 III letra "c"), impondo (poder-dever) ao Estado, a obrigatoriedade de privilegiar tal tipo associativo (2).

Muito embora possa-se tirar da legislação recepcionada de 1971, mediante interpretação, as conclusões que a seguir apresentarei, admito que a solução ideal seria, em nível de "lege ferenda", ofertar, o Congresso Nacional, legislação adequada ao texto de 1988, que, se fosse veiculado, no concernente ao direito tributário, por lei complementar, obrigaria todas as entidades federativas.

Tendo o presidente Lula --e seu partido político-- sempre propugnado pela valorização do cooperativismo, parece-me ser o momento oportuno para produção de legislação abrangente, organizativa, com objetivos econômicos nítidos e tratamento tributário incontroverso, com o que restaria fortalecido o atual cooperativismo, com custos menores e evolução maior, a favor do desenvolvimento nacional.

Nem por isto, a legislação vigente deixa, entretanto, de ofertar elementos suficientes para uma exegese integrativa da lei ordinária promulgada sob a Carta pretérita e recepcionada pela Constituição de 1988, que regulou as cooperativas e a inequívoca opção constituinte por tais entidades, expressa, fundamentalmente, nos artigos 146, inciso III, letra "c" e 174, § 2º (3).

Passo, pois, a analisar a legislação vigente, comentando alguns pontos a ela referentes, que me parecem de relevância.

O primeiro passo é definir o que seja uma sociedade cooperativa (4).

O segundo, é explicitar o perfil do ato cooperativo.

O terceiro, verificar se os "planos de saúde", patrocinados pelas cooperativas --tipologicamente diferentes dos demais planos conhecidos-- estariam ou não compreendidos na norma que definiu seu objeto social e, por outro lado, se seriam ou não atos cooperativos, aqueles atos decorrenciais de sua administração e existência.

Reza, o artigo 5º da lei das sociedades cooperativas (5764 de 16/12/1971), o seguinte:

"As sociedades cooperativas poderão adotar por objeto qualquer gênero de serviço, operação ou atividade, assegurando-se-lhes o direito exclusivo e exigindo-se-lhes a obrigação do uso da expressão "cooperativa" em sua denominação" (5). (grifos meus)

A primeira disposição, claramente, enuncia que pode ser objeto social da cooperativa qualquer gênero de serviço, operação ou atividade. Vale dizer, nenhum objeto lícito de atividade econômica é de se excluir à formatação das cooperativas.

Onde não distingue a lei, ao intérprete não cabe distinguir. Desde que não ilícita, portanto, qualquer atividade de densidade econômica, pode ser objeto social de uma cooperativa.

O segundo aspecto é que o seu escopo é exclusivo, o que vale dizer, atuação em prol dos cooperados, sendo albergador daquelas atividades próprias das relações econômicas. A exclusividade diz respeito, como é óbvio, apenas à partilha dos benefícios entre os cooperados, visto que não há possibilidade de as operações concernentes ao objeto social serem exclusivamente dos cooperados. Até mesmo nas cooperativas de consumo, os bens, que são disponibilizados aos cooperados, são adquiridos de terceiros, o mais das vezes, não cooperados (6).

O terceiro elemento, de natureza formal, é que tais entidades devem ostentar, em sua denominação, a expressão "cooperativa".

O objeto social das cooperativas, à evidência, perfila o das próprias sociedades, de vez que, pelo artigo 3º da Lei 5764/71, estão assim esculpidas:

"Art. 3º Celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro". (grifos meus)

Ainda aqui, idêntico espírito ofertam os elementos que compõem os contornos do desenho legislativo, em tríplice enunciado.

No primeiro deles, os cooperados, ou seja, as pessoas que assinam o contrato instituidor da entidade, obrigam-se a contribuir, reciprocamente, com bens e serviços para o exercício de uma atividade econômica. Este primeiro requisito não diferencia a formação de uma cooperativa da de qualquer outra sociedade ou instituição.

Já o segundo, reduz o âmbito das semelhanças, eliminando todas as associações beneméritas, visto que as características da entidade benemérita e/ou filantrópica é atuar em proveito de outrem, ou seja, de terceiros que não se confundem com as pessoas que as constituem.

Ora, as cooperativas objetivam proveito comum dos cooperados.

O terceiro aspecto, que torna o modelo único, é o fato de que a entidade não pode ter como objetivo o lucro. Os cooperados podem se beneficiar das atividades cooperadas (proveito comum), mas a entidade não pode pretender o lucro (7).

Este terceiro requisito afasta a semelhança com as entidades de fins lucrativos.

Não analisarei o artigo 4º, que oferta as condições formais para a configuração de uma cooperativa e que explicita, em dois pontos, tratar-se de:

a) sociedade de pessoas

b) constituída para prestar serviços aos associados.

Em perfunctória exegese, são estas as características mais relevantes das sociedades cooperativas e de seu objeto social.

Para efeitos do presente parecer, é de se realçar, fundamentalmente, o fato de as atividades terem densidade econômica, objetivarem servir aos associados e não terem intuito lucrativo (8).

Passo, agora, ao exame do segundo aspecto preambular, qual seja, o ato praticado pela cooperativa e sua natureza.

Como o direito comercial tem, como seu elemento de maior densidade, o ato mercantil, o direito cooperativo tem, no ato cooperativo, a razão de sua existência.

Declara, o artigo 79 da retrocitada lei, que:

"Art. 79. Denominam-se atos cooperativos os praticados entre as cooperativas e seus associados, entre estes e aquelas e pelas cooperativas entre si quando associados, para a consecução dos objetivos sociais.

Parágrafo único. O ato cooperativo não implica operação de mercado, nem contrato de compra e venda de produto ou mercadoria".

O ato cooperativo é aquele, portanto, que se realiza entre

a) a cooperativa e seus associados;

b) entre seus associados e a cooperativa;

c) entre cooperativas,

sempre na busca dos objetivos sociais da instituição.

O parágrafo único, ao retirar natureza mercantil à relação entre as cooperativas entre si e entre estas e seus cooperados, declara que o ato cooperativo não caracteriza:

1) a existência de uma operação de mercado, nem

2) a obrigação de um contrato de compra e venda de produto ou mercadoria (9).

À evidência, apenas os atos entre cooperados e associados são atos cooperativos.

Praticam, as cooperativas, inúmeros atos não cooperativos essenciais à sua existência, podendo ser atos mercantis puros.

Uma cooperativa de consumo, por exemplo, ao adquirir os produtos que disponibilizará a seus associados, a preço pouco superior ao custo, pratica atos de natureza mercantil, visto que, no outro pólo, encontra-se, no mais das vezes, empresa mercantil.

No momento, todavia, em que revende os produtos adquiridos para seus associados, o ato de mercantil se descaracteriza como tal e passa a ser um ato cooperativo, porque praticado entre a cooperativa e seus associados, ainda que o preço seja superior ao da aquisição mercantil (10).

Em uma cooperativa de serviços ou de produção - que angaria clientes e disponibiliza atividades para os cooperados, sendo este o seu objeto social - todos os atos praticados pela cooperativa tendentes a conquistar uma clientela para os associados são atos cooperativos, visto que, em verdade, constituem a própria essência da cooperativa assim organizada.

Ao contrário das cooperativas de consumo - em que a primeira fase do ato tem característica mercantil e apenas o ato de transferência de mercadorias ou bens da cooperativa para os associados passa a comportar a figuração jurídica de ato cooperativo - nas cooperativas de produção ou de serviço, a ação de atrair clientes para os associados formata o ato cooperativo "ab initio", inclusive na própria atuação de disponibilizar bens e mercadorias de terceiros.

É que a relação com terceiros é instrumento essencial, nas cooperativas de produção ou serviços, visto que são os terceiros que viabilizam o interesse comum, propiciado pela cooperativa, ao buscar e conquistar clientes, ou veiculando a produção dos cooperados para eventuais interessados.

Neste caso, como o pólo ativo é ocupado por um cooperado, o intermediário é a cooperativa e no pólo passivo encontra-se o terceiro atraído pela ação da entidade, o ato decorrente dessa relação, tem natureza cooperativa e não mercantil. Até porque, se não tivesse tal natureza, não poderia jamais haver cooperativas de produção ou serviços, visto que terceiros não cooperados são sempre o mercado a ser atingido (11).

Esta distinção é essencial para que se possa compreender a orientação dos Tribunais Superiores, sobre a matéria, embora não tenham ainda examinado as particularidades que diferenciam os "atos mercantis" praticados pelas cooperativas de consumo, dos "atos cooperativos", que são aqueles próprios das cooperativas de serviços ou produção.

Em outras palavras, ainda não mereceu maior reflexão o fato de as cooperativas de produção e serviço apenas trabalharem com terceiros não cooperados (busca de clientela), sendo todos os seus atos cooperativos, visto que direcionam os possíveis usuários para serviços prestados exclusivamente pelos associados.

Tal posicionamento leva-me, agora, à terceira consideração, concernente, especificamente, às cooperativas de prestação de serviços médicos, que devem ser examinadas, na inteligência que extraio dos dispositivos retro-citados, à luz de suas características próprias e diversas dos demais serviços médicos ofertados em planos de saúde, por entidades que não são cooperativas (12).

A cooperativa médica é organizada para assegurar serviços em prol de seus associados, estes, por suas atividades profissionais, sendo contribuintes dos diversos tributos incidentes sobre o trabalho que realizam.

A função essencial da cooperativa médica é, portanto, exclusivamente prestar serviços para seus cooperados, todos médicos.

Tais serviços, à evidência, como determina o artigo 3º da Lei 5764/71, são realizados em

"proveito comum".

A cooperativa angaria clientes para seus cooperados e, por esta razão, este ato é tipicamente um ato cooperativo (13).

Ocorre que os médicos associados à cooperativa não são apenas clínicos, mas especialistas em diversas áreas, grande parcela sendo constituída de cirurgiões.

Para o exercício de sua atividade, esses associados necessitam utilizar suporte instrumental ofertado pelos hospitais, casas de saúde etc. Um médico-cirurgião não pode exercer sua atividade sem o aparato hospitalar.

Sustentar o contrário seria o mesmo que admitir a possibilidade de um soldado ir à guerra sem armas ou com armas sem munição (14).

Nitidamente, não descaracteriza os serviços da cooperativa encaminhar clientes para hospitais onde seus cooperados atendam seus pacientes. O ato cooperativo é o ato de encaminhar pacientes para a prestação de serviços, submetendo-se, a atuação individual do médico ou do estabelecimento hospitalar, à tributação normal de uma prestação de serviços remunerada.

Em outras palavras, o ato de angariar e levar clientes para os associados é típico ato cooperativo. A prestação de serviços pelo associado ou sistema hospitalar por ele indicado é ato de exercício profissional, remunerado e tributado (15).

Um ponto, agora, de natureza tributária, na exegese constitucional, merece consideração, ainda preliminar.

A letra "c", do inciso III, do artigo 146 do CTN declara que:

"c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas.",

ofertando conotação diferencial ao ato cooperativo, em relação a todos os demais atos de densidade econômica.

Há decisão do STF declarando que "adequado" não quer dizer "necessariamente preferencial".

Se, entretanto, o inciso "c" não tivesse por finalidade diferenciar o "ato cooperativo" dos demais "atos de densidade econômica", o dispositivo seria rigorosamente inútil, absolutamente inócuo, acintosamente desnecessário, sobre passar um atestado de insensatez ao constituinte, em dispor que o "tratamento adequado ao ato cooperativo" haveria de ser rigorosamente igual ao dispensado aos demais atos mercantis ou de prestação de serviços!!! (16)

Um tal raciocínio faz lembrar o célebre episódio em que, por ocasião da inauguração de uma ponte sobre famoso rio, um desavisado embaixador afirmou: "sob essa ponte passam os navios de grande calado", acrescentando: "e os de pequeno também!"

Em homenagem à inteligência e técnica legislativa do constituinte, só posso admitir que o tratamento de ato cooperativo deva ser diferenciado e não igual aos demais atos, assim como deverá ostentar, necessariamente, onerosidade tributária menor, para que o cooperativismo -objeto maior do comando supremo- seja estimulado (17).

Escrevi, por outro lado, ao comentar o artigo 4º da Lei n. 5764/71:

"Pelo dispositivo, são as cooperativas de trabalho que prestam serviços a seu cooperado e não o inverso, o que vale dizer, as cooperativas não se assemelham às empresas que contratam serviços e os remuneram.

Quanto às empresas em geral, que seriam obrigadas a recolher a nova imposição, se constitucional fosse, que não é, quem presta serviços é o empresário, o trabalhador autônomo, avulso ou outras pessoas físicas. São estes que prestam serviços à empresa e, por esta razão, pretendeu o legislador complementar atingi-los, visto que fora do campo das contribuições sociais elencadas no artigo 195 "caput" da Constituição.

O tomador do serviço é, nitidamente, a empresa, que recolheria a nova imposição, se constitucional fosse, que não é, ao Erário.

Ora, no caso das cooperativas, o tomador do mesmo é cooperado, isto é, aquele que recebe o benefício da cooperativa, que é quem presta o serviço. Não é o cooperado que presta um serviço a ser remunerado pela cooperativa, mas a cooperativa que presta serviços ao cooperado" (18).

Uma última consideração sobre o § 2º do artigo 174.

Na dualidade de iniciativa econômica, claro ficou a inequívoca intenção do constituinte de estimular o movimento cooperativo e impor à lei a outorga de benefícios inequívocos à formação de cooperativas.

É de se lembrar que o § 2º é aquele do artigo 174, que determina seja o planejamento econômico obrigatório para o poder público e apenas indicativo para o setor privado.

Os doutrinadores de direito econômico vêem, no art. 174, a consagração do regime da livre iniciativa, da livre concorrência e do não-dirigismo econômico, cabendo ao Estado não impor, mas estimular comportamentos nos agentes econômicos. sobre privilegiar o movimento coorporativo e outras formas associativas semelhantes, para o fluir intraumático das relações mercantis ou paramercantis (19).

Complementa, portanto, no plano do direito econômico, o que o artigo 146, inciso III, letra "c", veiculou, no direito tributário.

Isto posto, passo a responder às diversas questões formuladas pela consulente:

1) A resposta é positiva. Aplica-se o princípio da dupla qualidade, em face de o cooperado ser associado e também usuário dos serviços prestados pela sociedade.

O importante, nesta resposta, é deixar claro que esta dupla qualidade não desfigura a consulente como entidade cooperativa, até porque é da própria essência das cooperativas de serviço ou produção, como expus na introdução deste parecer, a captação de recursos para seus cooperados, neste aspecto residindo a essência do "ato cooperativo". O princípio da dupla qualidade, nas cooperativas de serviços, é inerente a seu perfil e não elemento desconformador.

2) O artigo 4º da Lei 5764/71 esclarece que a finalidade das cooperativas de serviço é "prestar serviços aos associados", de forma que as diferencia de outras sociedades (20).

A finalidade da cooperativa é aquela exposta na lei. Somente configuram cooperativas de serviços as entidades que preenchem os requisitos lá mencionados.

O objeto, todavia, pode ser idêntico ao da finalidade definida pela lei ou ter âmbito menor de atuação, razão pela qual, embora todas as cooperativas de serviços tenham a mesma finalidade (prestar serviços a seus associados), nem todas elas prestam o mesmo tipo de serviço e nem todos os serviços prestados esgotam as possibilidades permitidas pelas finalidades expostas em lei para as cooperativas.

O objeto de uma cooperativa está para sua finalidade, como, no direito processual, o procedimento está para o processo. A distinção, portanto, existente não desconfigura a integração entre finalidade e objeto de uma cooperativa, visto que o objeto deve estar fundado na finalidade permitida pela lei, ou seja, nos fins admitidos legalmente.

3) Já teci considerações sobre o "ato cooperativo" nas considerações iniciais.

A interpretação que oferto, pois, à questão formulada é de que:

a) o tratamento tributário do ato cooperativo deve ser mais benéfico que o dispensado às demais entidades;

b) deve ser estabelecido em lei complementar, de observância obrigatória pelas demais entidades federativas, no que diz respeito ao ato cooperativo, mas não a de outros aspectos concernentes à cooperativa;

c) à falta de lei complementar, por força do artigo 24 § 3º da Constituição Federal, União, Estados e Municípios podem legislar, por lei ordinária, até o advento da lei complementar (21).

4.1) O entendimento da Receita Federal entre ato cooperativo e não cooperativo é incorreto.

Restringe, onde a lei não permite a restrição. Como mostrei, nas considerações preliminares deste parecer, os serviços auxiliares são essenciais para que o serviço prestado pelo cooperado seja possível a terceiros, na captação de clientela.

É de se lembrar, como disse no início, que o artigo 79 da Lei n. 5764/71 impõe, na tríplice relação (cooperativa-associados, associados-cooperativas, entre cooperativas) que tais atos cooperativos impliquem prática

"para a consecução dos objetivos sociais".

Neste ponto, parece-me residir o equívoco da Receita, na medida que sem os "atos auxiliares" não é possível atingir "os objetivos sociais" da cooperativa.

Uma cooperativa, por exemplo, que só conjugasse "médicos cirurgiões", seria inviável, pois a prestação de serviços a terceiros, em decorrência da captação de clientela pela entidade, só é possível em "hospitais", razão pela qual, como já demonstrei em outro parecer, não é possível desconsiderar tais atos auxiliares. Esta é, aliás, a exegese jurídica esposada pelo Conselho Federal de Contabilidade na Resolução CFC 944/02, referida na consulta (22).

4.2) Entendo que a entidade não tem capacidade contributiva. Ela é, apenas, mera coletora de clientes para os médicos, estes sim sendo os sujeitos passivos das obrigações tributárias, pelos serviços que prestam. A cooperativa, a meu ver, é uma entidade, quando prestadora de serviços a seus associados, desonerada de tributação, visto que, de rigor, são os próprios associados que se "auto-prestam" serviços de captação ao constituírem a cooperativa. E neste aspecto reside a essência do ato cooperativo típico, praticado pelas cooperativas de serviços.

A cooperativa não tem capacidade contributiva e sim os seus cooperados (23).

4.3) O ato cooperativo, enquanto exclusivamente de prestação de serviços de captação de clientela para seus cooperados -de rigor, uma auto-captação, via entidade formada para tal finalidade-não pode ter seus atos tributados.

Tratamento "adequado" significa não tributar o que é adequado ao cooperativismo e tributar o que "não é adequado". Em outras palavras, a prestação de serviços pelo cooperado é tributável na pessoa do cooperado. A prestação de serviços ao cooperado (angariar clientes) não é tributável, pois, senão, haveria uma dupla tributação, no cooperado e na cooperativa PELO MESMO SERVIÇO, OU SEJA, O ATENDIMENTO MÉDICO A TERCEIROS.

5) Tenho defendido, há anos, a tese de que não há base de cálculo, à luz do que dispõe a Constituição e a legislação recepcionada, para a exigência, das cooperativas de trabalho médico, de nenhum dos tributos enunciados na questão cinco.

À evidência, quando substituto tributário (retenção na fonte de tributos devidos por terceiros) a base de cálculo decorre não de seus "atos próprios", mas de valores percebidos por terceiros, como, por exemplo, ocorre com a retenção de imposto sobre a renda de trabalhadores que trabalham para cooperativa (24).

Em parecer que ofertei à própria consulente, em 1996, disse:

"Ora, o cooperado médico nunca atende a pessoa jurídica, que não sofre de moléstias, a não ser aquelas provocadas pelos governos a título de incorretas políticas monetária, fiscal, industrial, agrícola etc. Moléstia biológica, só a pessoa física é que sofre e só esta é que pode ser cuidada pelo médico. Ora, na prestação de serviços a pessoas físicas, o médico recebe remuneração destas diretamente ou das empresas para as quais elas trabalham. Na maior parte das vezes, as empresas pagam apenas por facilidade, recuperando do empregado o que pagaram ao profissional" (25).

A resposta, portanto, a meu ver --como as cooperativas de serviços médicos têm apenas a finalidade de angariar clientes, sendo os médicos os prestadores de serviços e sujeitos passivos dos tributos- é que não podem ser cobrados tributos das cooperativas, pelo ato de repasse dos recursos recebidos aos cooperados.

Reconheço não ser pacífica a afirmação, mas entendo que, para evitar dúvidas, poderia o Governo Lula, que sempre defendeu o cooperativismo, disciplinar de vez e de maneira clara, a questão, em atendimento a teleologia da Constituição (art. 146, inc. III, letra "c"), até porque o Presidente Lula foi um dos constituintes em 1988.

6) Entendo que não, na medida em que é entidade sem fins lucrativos, não havendo o que distribuir. A própria lei fala em "saldos", quando os há, e jamais em "lucros". A terminologia é, pois, a mais adequada.

Pessoalmente, no conceito que tenho de assistência social "lato sensu" a partir das imunidades constitucionais, entendo que tudo que diz respeito à Seguridade Social o é (Previdência, Saúde e Assistência Social "stricto sensu"), razão pela qual -a meu ver, e reconheço não ser pacífica minha exegese- tais entidades seriam de assistência social "lato sensu" e, portanto, imunes.

Escrevi:

"O Tribunal Federal de Recursos já definiu que a imunidade tributária constitucional hospeda o gênero "assistência social", o que implica o estalajar as diversas formas de seguridade. A manutenção no atual do mesmo texto da Emenda Constitucional n. 1169, já pacificado pela jurisprudência do Tribunal Federal de Recursos, hoje Superior Tribunal de Justiça, permite, pois, aceitar tal exegese, de resto, conforme a interpretação da esmagadora maioria dos juristas brasileiros. Em outras palavras, as instituições, a que se refere o art. 150, VI, são de assistência social "lato sensu" e não "stricto sensu".

O art. 14 do Código Tributário Nacional, já anteriormente, impunha o requisito da inexistência de fins lucrativos, com o que seus pressupostos foram recepcionados pela nova ordem" (26).

Desta forma, a saúde estaria enquadrada na assistência social "lato sensu".

7) A sociedade cooperativa não fatura, mas repassa honorários de clientes dos cooperados para os próprios cooperados, retirando a parcela correspondente aos custos de sua manutenção. Não há, pois, faturamento, no sentido mercantil da expressão.

7.1) O "repasse líquido" não representando "faturamento", não há como identificá-lo como tal (27).

7.2) Como já disse na resposta ao inciso 7.2, não vejo como PIS e COFINS poderiam ser exigidos das cooperativas de serviços, reconhecendo não ser pacífica, nos Tribunais, tal inteligência. É que, de rigor, os serviços médicos prestados ou não pelas sociedades de profissionais, será recolhido pela prestação destes serviços a terceiros e não pelo "repasse líquido", efetuado pela cooperativa, dos honorários recebidos dos clientes aos cooperados, os verdadeiros prestadores dos serviços.

Considero inconstitucional a exigência de PIS e COFINS, no sistema brasileiro, sobre as cooperativas médicas, merecendo exame mais aprofundado pelo STF (inclusive pela via do controle concentrado do artigo 102, inciso I, letra "a") para que se plasme, definitivamente, um tratamento jurisprudencial da legislação vigente sobre as cooperativas médicas à luz do estatuto supremo (28).

A outra solução "de lege ferenda" seria o Governo Lula, defensor do cooperativismo, equacionar a questão definitivamente, reformatando a legislação de 1971, em termos claros.

8) Entendo que deveria ser aplicada, por uma questão de adequação ao princípio constitucional, muito embora esta norma infra-legal tenha menos força formal que a lei tributária ou até mesmo que interpretação da SRF sobre a questão. Por ser juridicamente correta, deveria, todavia, ser utilizada para, no conflito normativo, possibilitar ou a solução pretoriana ou a reformulação legislativa ou administrativa, por parte do governo (29).

9.1) Entendo que a empresa que solicita os serviços. Jamais à cooperativa. O médico presta serviços a alguém (pessoa física ou trabalhador de pessoa jurídica). Se a pessoa jurídica é quem contrata e é quem paga, cabe a ela reter o tributo correspondente à remuneração do serviço prestado e não à cooperativa, uma singela repassadora dos honorários líquidos do cooperado pelo serviço por este prestado à pessoa da empresa contratada.

9.2) A contratada é mera repassadora.

10) Não, na medida em que não são "lucros" e sim devolução de "saldos" de administração da cooperativa, que, inclusive, poderá ter prejuízos com necessidade de "aporte" de mais recursos pelos cooperados, que nem por isto poderão deduzi-los do imposto de renda por eles devido (30).

Em outras palavras, quando há "saldos", não há imposto de renda a ser retido na fonte. Quando há "prejuízo", não poderá o cooperado reduzir, do imposto de renda a pagar pelos serviços prestados, o "aporte" necessário às cooperativas para cobri-los. Nem nos "saldos" há imposto de renda a reter dos cooperados, nem nos "prejuízos" com cobertura da diferença pelo cooperado à cooperativa, o direito deste de deduzir tal "prejuízo".

S.M.J.

NOTAS

(1) Escrevi: "Penso que a matéria possa ser examinada à luz de dois tipos de atos. Aquele que torna o membro da cooperativa seu integrante e os atos de comércio praticados pela cooperativa.

Não vislumbro, pois, à primeira vista, a possibilidade de outros aspectos do cooperativismo necessitarem de lei complementar para veiculação, visto que apenas do ato cooperativo a Lei Suprema cuidou" (Comentários à Constituição do Brasil, 6º vol., tomo I, ed. Saraiva, 2a. ed., 2001, p. 108).

(2) Celso Bastos comenta o § 2º do artigo 174, dizendo: "O estímulo ao cooperativismo encontra inspiração muito visível nas Constituições portuguesa e espanhola. Tal como na nossa, o que ali se procura é fomentar essa modalidade associativa, que apresenta, sem dúvida nenhuma, um grande alcance social, quando levada a efeito, debaixo de um autêntico espírito cooperativo.

No entanto, o Estado não pode impor essa modalidade de organização. Gomes Canotilho e Vital Moreira fazem excelente observação em torno deste ponto:

"O Estado está obrigado a estimular e a apoiar a criação de cooperativas, bem como a sua actividade, mas não pode impô-las nem tutelá-las. Para que esta obrigação estadual não vá de encontro à liberdade de constituir cooperativas e ao direito destas de prosseguirem livremente suas actividades, os estímulos e apoios do Estado não podem traduzir-se em formas de ingerência na Constituição ou na vida das cooperativas e devem pautar-se pelos princípios de igualdade, da imparcialidade e da não discriminação. Constitucionalmente, pode (e deve) haver um cooperativismo de Estado" ( Constituição da República Portuguesa anotada, 2. ed., Coimbra Ed., v. I, p. 414)" (Comentários à Constituição do Brasil, 7º vol., ed. Saraiva, 2a. ed., 2000, p. 101/103).

(3) Estou convencido que no concernente a tal exegese, no campo tributário, a lei de 1971 foi recepcionada, em nível de lei complementar. Lembro a lição de Luciano da Silva Amaro sobre idêntica recepção do CTN (lei ordinária) pela Constituição de 1967: "É correta a conclusão a que a doutrina pátria, no sentido que o CTN vigora plenamente após a Constituição de 1967, e tem eficácia de lei complementar. O que talvez mereça ser mais precisamente fixado é o fundamento jurídico dessa eficácia", continuando: "Onde, segundo nos parece, está o encaminhamento da questão é no princípio da recepção, estudado no Direito Constitucional Comparado.

Por esse princípio, quando se cria novo ordenamento jurídico-político fundamental (nova Constituição), a ordem jurídica pré-existente, no que não conflite, materialmente, com aquele, permanece vigorando, é aceita pela nova ordem constitucional, qualquer que tenha sido o processo de sua elaboração, desde que conforme ao previsto na época dessa elaboração, pois, não o sendo, a invalidade teria atingido a legislação já desde o seu nascimento" (Direito Tributário nº 3, José Bushatsky Editor, 1977, p. 288).

(4) A Constituição Federal em diversos dispositivos oferta tratamento diferencial às cooperativas, nos artigos 5º, inciso XVIII, 21, inciso XXV, 174, §§ 2º, 3º e 4º, 146 inciso III letra "c", 187 VI, 192, inciso VIII e 199, § 1º, estando os dispositivos assim redigidos:

"Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)

XVIII. a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento";

Art. 21 Compete à União: .... XXV. registros públicos;

Art. 174 Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

...

§ 2º A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo.

§ 3º O Estado favorecerá a organização da atividade garimpeira em cooperativas, levando em conta a proteção do meio-ambiente e a promoção econômico-social dos garimpeiros.

§ 4º As cooperativas a que se refere o § anterior terão prioridade na autorização ou concessão para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas de minerais garimpáveis, nas áreas onde estejam atuando, e naquelas fixadas de acordo com o art.21, XXV, na forma da lei.

...

Art. 146 Cabe à lei complementar: (...) III. estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: (...) c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas.

...

Art. 187 A política agrícola será planejada e executada na forma da lei, com a participação efetiva do setor de produção, envolvendo produtores e trabalhadores rurais, bem como dos setores de comercialização, de armazenamento e de transportes, levando em conta, especialmente: .... VI. o cooperativismo;

....

Art. 192 O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do país e a servir aos interesses da coletividade, será regulado em lei complementar, que disporá, inclusive, sobre: .... VIII. o funcionamento das cooperativas de crédito e os requisitos para que possam ter condições de operacionalidade e estruturação próprias das instituições financeiras.

...

Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.

§ 1º As instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos".

(5) Pinto Ferreira comenta o artigo 174, § 2º, dizendo: "ESTÍMULO AO COOPERATIVISMO - O cooperativismo constitui uma forma de ajuda mútua dos seus integrantes, a fim de evitar custos de consumo, produção e crédito em favor de pessoas estranhas aos associados. Objetiva valorizar o homem, bem como aumentar a produtividade econômica, como um acelerador e multiplicador do desenvolvimento econômico. Objetiva ainda suprir de bens e serviços os seus membros, bem como promover uma programação social e educativa (V. comentários ao art. 187, VI)" (Comentários à Constituição Brasileira, 6º vol., Ed. Saraiva, 1994, p. 359). (grifos meus)

(6) Maria Helena Diniz assim conforma a cooperativa de consumo: "COOPERATIVA DE CONSUMO. Direito civil. É aquela que compra produtos por atacado a fim de revendê-los a seus associados, para consumo pessoal ou domiciliar, a preço de custo, acrescido de pequena porcentagem para as despesas, repartindo entre aqueles os razoáveis lucros anuais verificados pelo balanço" (Dicionário Jurídico, vol. 1, Ed. Saraiva, 1998, p. 886).

(7) Renato Lopes Becho esclarece: "Dizer que uma cooperativa é uma empresa significa, para nós, dizer que há um grupo de pessoas que aportam capital, trabalho, dedicação, esforço e energia para a consecução de um fim específico, de conteúdo econômico, buscando um objetivo direto ou indireto, para si ou para os seus.

Uma atividade empresarial se diferencia pela finalidade e pela atuação de uma atividade pia, de natureza humanitária, caritária. Uma cooperativa não é uma instituição de caridade. É uma empresa.

Entretanto, assim como as sociedades caritárias não possuem finalidade lucrativa, a cooperativa também não possui. Tanto é assim que, logo no artigo 3º da Lei 5.764/71 encontramos, na definição legal de cooperativa, sua finalidade distanciada do lucro, ao lado do reconhecimento de sua natureza econômica. Essa natureza diferenciará, com traços indeléveis, as cooperativas das instituições humanitárias.

E o meio econômico, assim como afasta o nosso objetivo de estudo das associações pias, aproxima-o das demais empresas, civis e comerciais. Tanto aproxima que as ações de uma cooperativa mais aparentam atividade comercia] ou civil, genericamente, do que de caridade.

Porém, o objetivo não lucrativo das cooperativas é traço marcante para afastá-las das demais formas empresariais.

Entretanto, por ser atividade econômica, a cooperativa precisará ter contabilidade própria, operará no meio empresarial intensamente, e produzirá, como decorrência também econômica -por trabalhar com dinheiro- resultados econômicos. Esses resultados podem ser positivos, neutros ou negativos, da mesma forma que as empresas comerciais ou civis que trabalham com dinheiro.

Se na aparência (que pouco significa para o Direito, vg. ser o navio, em termos jurídicos, bem imóvel) esses resultados são iguais, juridicamente, se diferenciam radicalmente.

Vamos demonstrar, assim, que o resultado positivo de uma cooperativa não se confunde com o resultado positivo de empresas lucrativas. E não se confunde com o objetivo (cooperativa é entidade não lucrativa) e também na destinação desse eventual resultado financeiro. É disso (a destinação) que trata o princípio em tela.

Internamente, os resultados positivos das cooperativas devem voltar para os associados, na proporção de suas operações com a instituição (letra c do princípio em tela). Podem decidir, contudo, mantê-los na sociedade, ou como forma de aumento do capital (que não será remunerado, como vimos no item precedente), ou doá-los à sociedade.

Esse resultado positivo é chamado de excedente ou sobra, porque a empresa cooperativa busca, para si apenas a satisfação dos custos administrativos e operacionais, para atingir resultado que lhe é obrigatório, como veremos no momento oportuno. Esse resultado é igual a zero" (Tributação das Cooperativas, Ed. Dialética, 2a. ed., São Paulo, 1999, p. 112/113).

(8) Em profissão de fé, José Cretella Jr. afirma: "Conseguida a supressão o cooperativismo vencerá o capitalismo, assumindo-lhe o lugar, e passando a orientar a indústria e a agricultura", concluindo "A lei apoiará e estimulará outras formas de associativismo, assim como o faz com as cooperativas. Na verdade, a lei nem apóia e nem estimula. A lei estabelece meios de apoio e meios de estímulo, como se dirá em redação mais técnica.

Os integrantes da cooperativa, os corporados, ou, de modo mais específico, os cooperados, são os próprios produtores ou consumidores que, associados, promovem a melhoria de seus ganhos pessoais. Funcionando para os próprios cooperados, a cooperativa funciona em benefício do elemento pessoal que a organiza. Se os produtores, por um lado, podem organizar cooperativas para melhor atuar no mercado, os consumidores, por outro lado, podem associar -se, mediante a cooperativa, e adquirir bens e serviços por melhores preços.

Na cooperativa, o cooperado é usuário ou cliente, regendo a entidade o princípio da dupla qualidade. Na cooperativa, agrícola ou pecuária, por exemplo, o agricultor e o pecuarista entregam a colheita ou o gado, respectivamente, para que tais produtos sejam vendidos pela entidade associativa, vigorando, então, o princípio da identidade, isto é, o objetivo da empresa coincide com o dos cooperados" (Comentários à Constituição 1988, vol. VIII, Forense Universitária, 1993, p. 4050/4051).

(9) Geraldo Ataliba, anos atrás, em parecer a que tive acesso, declara, com precisão, que: "Os atos cooperativos, não configuram serviços, em sentido técnico. Os atos em questão referem-se a relações internas entre cooperativa e cooperado, idênticas às que correlacionam sócios e sociedade, quaisquer que sejam o tipo de natureza. Assim como não se pode falar em serviço tributável em decorrência das relações entre o sócio e a sociedade por cotas de responsabilidade limitada, inviável cogitar de serviço tributável, igualmente, nas relações que enlaçam cooperativa e cooperado (...) Só há prestação de serviços, onde haja terceiros.

Cooperado e cooperativa, umbilicalmente ligados, não são terceiros, um em relação à outra, ou esta em relação àquele.

0 ato cooperativo configura o impropriamente designado, mas expressivo "serviço para si próprio", intributável por excelência porque não há, tecnicamente, serviço para si mesmo. Ausente está o requisito indispensável da presença de outrem, do terceiro destinatário alheio à sociedade", concluindo: "Em síntese: a) -os " serviços" das cooperativas são intributáveis, à luz da conotação constitucional de serviço;

h) -ainda que assim não fosse -ad argumentandum tantum - não seria tributável por ausência de previsão em lei municipal".

(10) O TRF 3a. Região decidiu que o ato cooperativo não seria tributável pelo imposto sobre a renda, ao dizer: "Imposto de Renda. Ato cooperativo. Não-incidência. Os rendimentos decorrentes de operações financeiras de sociedades cooperativas praticadas a fim de preservar as disponibilidades de caixa não são tributáveis pelo Imposto de Renda. O elenco do art.129 do Regulamento do Imposto de Renda é exaustivo na configuração das hipóteses em que haverá tributação, por se tratar de desvirtuamento da atividade cooperativa. Não é cabível a interpretação extensiva do art.111 da Lei 5.764/71, e do art.129 do RIR que lhe corresponde, sob pena de se frustrar o alcance da exoneração tributária instituída em favor da atividade. Apelação improvida" (TRF, 3a. Região, AC 91.03.024908/SP, rel. Juiz Andrade Martins, 4a. Turma, decisão: 15-6-1994, DJ 2, de 8-8-1995, p.49478)".

(11) Leia-se, por exemplo, o Recurso Especial nº 254.549/CE (2000/0033977-6): "TRIBUTÁRIO. ISS. COOPERATIVAS MÉDICAS. INCIDÊNCIA.

1. As Cooperativas organizadas para fins de prestação de serviços médicos praticam, com características diferentes, dois tipos de atos: a) atos cooperados consistentes no exercício de suas atividades em benefício dos seus associados que prestam serviços médicos a terceiros; b) atos não cooperados de serviços de administração a terceiros que adquiram seus planos de saúde.

2. Os primeiros atos, por serem típicos atos cooperados, na expressão do art. 79, da Lei 5.764, de 16 de dezembro de 1971, estão isentos de tributação. Os segundos, por não serem atos cooperados, mas simplesmente serviços remunerados prestados a terceiros, sujeitam-se ao pagamento de tributos, conforme determinação do art.87 da Lei 5764/71.

3. As cooperativas de prestação de serviços médicos praticam, na essência, no relacionamento com terceiros, atividades empresariais de prestação de serviços remunerados.

4. Incidência do ISS sobre os valores recebidos pelas cooperativas médicas de terceiros, não associados, que optam por adesão aos seus planos de saúde. Atos não cooperados.

5. Recurso provido".

Se se levasse às últimas conseqüências o deliberado, jamais poderia haver cooperativas médicas, pois estas objetivam sempre atrair clientes para os médicos, administrando esta forma de conquista, com estruturas próprias. A decisão merece, pois, revisão conceitual.

(12) Já o STF, em acórdão que me foi encaminhado por Cooperativa, afirma que: "A apelada é uma cooperativa e se rege pela legislação especial concernente a este tipo de sociedade. Exerce atividades sem fim lucrativo, visando à captação de clientela para os médicos e hospitais seus associados, não havendo outros, de

profissões ou ramo comercial diferentes. Os clientes escolhem livremente os médicos e hospitais e lhes pagam os honorários e serviços, através da autora, a qual, depois, lhes repassa, retendo uma parcela, que se destina ao custeio de suas despesas administrativas e outras.

Não se trata de uma intermediação comum, como se fosse a autora um escritório de corretagem, que percebesse comissão por este tipo de serviço. Ela nada recebe de qualquer dos interessados a título de compensação ou lucro.

Realiza a autora, assim, o seu objetivo estatutário de buscar o aprimoramento da assistência médico-hospitalar, reduzindo-lhe os custos, porque seus cooperados percebem por uma tabela especial, inferior aos padrões comuns, preservando-se a liberdade de escolha pelo cliente.

Quem ganha com a atividade da cooperativa não é esta, mas sim, os seus cooperados e as pessoas que utilizam dos serviços destas.

Ocorre que os médicos e hospitais são contribuintes deste imposto e importaria em indisfarçável bitributação a cobrança do mesmo tributo, pela mesma atividade, também da cooperativa.

O ISSQN pressupõe a finalidade lucrativa da atividade exercida por seus contribuintes, afastando-se a sua incidência se se trata de idade cooperativa, como a autora, cujos objetivos não prevêem o lucro, como ficou dito e, ainda que este ocorra, reverterá em benefício de seus associados.

A atividade da autora não se insere em qualquer dos itens da lista de serviços tributáveis, que acompanha os decretos-lei n. 406/68 e 843/69, tratando-se, pois, de não incidência do imposto, como salientou o representante do Ministério Público, em seu excelente parecer de fls. 267/270, cujos fundamentos e conclusão a douta Procuradoria da Justiça subscreveu "in totum".

(13) O Dicionário Jurídico da Academia Brasileira de Letras Jurídicas no verbete "Cooperativas", veicula o seguinte esboço: "COOPERATIVA. S. f. (Lat., de cooperation) Dir. Obr. Sociedade de pessoas, com forma jurídica própria, de natureza civil, não sujeita a falência, constituída para prestar serviços aos associados, ou cooperativados, e que se distingue das demais sociedades de natureza econômica, além das peculiaridades especificadas em lei, em que não distribui lucros, mas resultados provenientes de suas operações. Cognatos: cooperativado (s.m.), participante de cooperativa; cooperativismo (s.m.), doutrina econômica sobre o sistema cooperativo, ou das cooperativas; cooperativista (adj. E s. 2 g.), relativo a cooperativas; adepto do cooperativismo. CF, arts. 5 (XVIII), 174 § 2; L 5764, de 16.12.1971 (L 6981, de 30.3.1982)" (grifos meus) (Dicionário Jurídico Academia Brasileira de Letras Jurídicas, Ed.Forense Universitária, 4ª ed., 1996, p.205)

(14) Tal percepção nitidamente houve por parte do STJ, como se percebe no RESP 33260/SP:

"Acórdão: RESP 33260/SP ; RECURSO ESPECIAL (1993/0007659-0)

Fonte: DJ DATA:07/06/1993 PG:11244

Relator: Min. GARCIA VIEIRA (1082)

Data da Decisão: 28/04/1993

Órgão Julgador: T1 - PRIMEIRA TURMA

Ementa: ISS - COOPERATIVA MÉDICA SEM FINS LUCRATIVOS.

NÃO ESTÃO OBRIGADOS AO RECOLHIMENTO DO ISS AS COOPERATIVAS, CONSTITUÍDAS PARA PRESTAR SERVIÇOS A SEUS ASSOCIADOS, SEM FINS LUCRATIVOS.

A CORREÇÃO MONETÁRIA NA REPETIÇÃO DE INDÉBITO E CALCULADA NOS TERMOS DA SÚMULA N. 46 DO EXTINTO TFR.

RECURSOS IMPROVIDOS.

Decisão: POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AOS RECURSOS.

Referências Legislativas: LEG:FED LEI:O05764 ANO:1971

ART:00004 ART:00005 ART:00007 ART:OOO03

LEG:FED. SUM: 000046 ANO: **** (TFR)

Veja: RESP 30.392-1-SP, RESP 12.370-PE, RESP 1.577-SP, (STJ)".

(15) De rigor, as atividades da consulente nitidamente se enquadram na primeira hipótese da ementa relatada pela eminente Ministra Eliana Calmon, assim redigida:

"Acórdão: RESP 215311/MA - RECURSO ESPECIAL (1999/0044189-3)

Fonte: DJ DATA: 11/12/2000 PG. 00188

JBCC. VOL. 00187 PG. 00128

LEXSTJ VOL. 00141 PG. 00133

Relator: MIN. ELIANA CALMON (1114)

Data da Decisão: 10/10/2000.

Órgão Julgador: T2 - SEGUNDA TURMA

Ementa: TRIBUTÁRIO - ISS - COOPERATIVA MÉDICA - ATIVIDADE EMPRESARIAL.

I. A cooperativa, quando serve de mera intermediária entre seus associados (profissionais) e terceiros, que usam do serviço médico, está isenta de tributos, porque exerce atos cooperativos (art. 79 da Lei n. 5.764/71) e goza de não-incidência.

2. Diferentemente, quando a cooperativa, na atividade de intermediação, realiza ato negocial, foge à regra da isenção, devendo pagar os impostos e contribuições na qualidade de verdadeira empregadora.

3. Recurso especial não conhecido.

Decisão: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso especial. Votaram com a Relatora os Ministros Paulo Gallotti, Franciulli Netto e Francisco Peçanha Martins.

(16) Escrevi: "Dizer, portanto, que o ato cooperativo terá tratamento adequado é admitir que não há necessidade de tal tratamento para as demais relações jurídico-tributárias, o que seria absurdo. E se o tratamento para as demais relações também deve ser adequado, à evidência, o dispositivo será inútil. A lei complementar deverá esclarecer a reticência constitucional." (Comentários à Constituição do Brasil, 6º vol, Tomo I, Ed. Saraiva, 2ª ed., 2001, p.109)

(17) Wolgran Junqueira ensina: "Cabe à lei complementar estabelecer normas gerais em matéria tributária, e, especialmente, sobre o adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas.

As cooperativas, têm um tratamento especial consignado na Constituição. O parágrafo 2º do artigo 174 é expresso: "A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo".

Desta forma, as cooperativas têm direito pré-estabelecido a um tratamento tributário diferenciado. Tendo as cooperativas este direito é sem qualquer sombra de dúvidas extensivo aos atos cooperativos. Estes se subsumem naqueles." (Comentários à Constituição de 1988, vol.2, Ed. Julex Livros, 1989, p.852)

(18) Parecer elaborado para entidade cooperativa de outro Estado.

(19) Miguel Reale ensina: "Vem, a seguir, o art. 174 que tem sido o cavalo de batalha dos que persistem em proclamar a natureza intervencionista do Estatuto Político de 1988. Nada melhor do que a reprodução desse preceito: "Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá na forma da lei (note-se) as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado" (Grifei).

Em face de um texto tão claro, custa-me crer que se possa pensar em dirigismo econômico, cuja característica principal é a natureza imperativa e não meramente indicativa do planejamento para os particulares, considerados individualmente ou consorciados em empresas.

Dir-se-á que o Estado é configurado como "Agente normativo e regulador" da economia, mas, a esta altura da evolução histórica, a afirmação contrária daria provas de preocupante irrealismo. O importante é que se declare, tal como consta do mencionado art. 174 que, naquela qualidade, o Estado deverá exercer suas funções de fiscalização e planejamento " na forma da lei". Mais uma vez o princípio da legalidade baliza a ação estatal e de modo puramente indicativo.

Praticam, pois, um grande erro aqueles que não contribuem com uma interpretação objetiva e serena do texto constitucional, assumindo atitude hostil ou depreciativa perante o Estatuto de 1988, o qual, apesar das múltiplas contradições que o comprometem, abre clareiras à defesa tão necessária da livre iniciativa, o que quer dizer, da economia de mercado" (Aplicações da Constituição de 1988, ed. Forense, 1990, p.15).

(20) O artigo 4º está assim redigido: "Art. 4º As cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos associados, distinguindo-se das demais sociedades pelas seguintes características:

I -adesão voluntária, com número ilimitado de associados, salvo impossibilidade técnica de prestação de serviços;

II -variabilidade do capital social representado por quotas-partes;

III- limitação do número de quotas-partes do capital para cada associado, facultado, porém, o estabelecimento de critérios de proporcionalidade, se assim for mais adequado para o cumprimento dos objetivos sociais;

IV - incessibilidade das quotas-partes do capital a terceiros, estranhos à sociedade;

V - singularidade de voto, podendo as cooperativas centrais, federações e confederações de cooperativas, com exceção das que exerçam atividade de crédito, optar pelo critério da proporcionalidade;

VI - quorum para o funcionamento e deliberação da Assembléia Geral baseado no número de associados e não no capital;

VII- retorno das sobras líquidas do exercício, proporcionalmente às operações realizadas pelo associado, salvo deliberação em contrário da Assembléia Geral; .

VIII - indivisibilidade dos fundos de Reserva e de Assistência Técnica Educacional e Social; IX -neutralidade política e indiscriminação religiosa, racial e social;

X - prestação de assistência aos associados, e, quando previsto nos estatutos, aos empregados da cooperativa;

XI - área de admissão de associados limitada às possibilidades de reunião, controle, operações e prestação de serviços".

(21) O § 3º do artigo 24 da C.F. está assim redigido: "Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades". No passado, defendi posição diversa: "Alguns autores vislumbram, no § 3º do art. 24, o direito de os Estados e do Distrito Federal legislarem sobre quaisquer tipos de normas gerais que caberia ao Parlamento Nacional produzir, seja pelo veículo menor da lei ordinária, seja pelo veículo maior da lei complementar.

Tais autores, inclusive, entenderam ser a lei complementar, lei federal, distinta da lei ordinária apenas em função da matéria tratada e do "quorum" necessário para a aprovação.

Segundo essa visão, as duas leis estruturalmente teriam a mesma função, sendo a única distinção o fato de o constituinte exigir para certas matérias uma, e para outras, outra.

Daí o pensamento que esposam de que, por exemplo, em matéria tributária, se a União não produzir lei complementar sobre normas gerais, tal faculdade será outorgada provisoriamente aos Estados e Distrito Federal até o momento em que as normas gerais superiores sejam veiculadas. Entendo que estes autores, apesar de seu brilho, não têm razão.

Em minha especial maneira de ver a fenomenologia da lei complementar, considero-a lei da Federação, e não da União, sempre que cuidando de normas gerais. Por conseqüência, para mim, o § 3º cuidou apenas daquelas normas gerais veiculáveis por lei ordinária, porque apenas esta é lei federal. A outra (complementar), sendo lei da Federação, não é lei federal" (Comentários à Constituição do Brasil, 3º vol., tomo II, ed. Saraiva, 2a. ed., 2002, p. 80/81). Minha exegese, todavia, não foi respaldada pelo Poder Judiciário.

(22) A equipe da Price Waterhouse assim interpreta a letra "a" do artigo 146, inciso III: "As sociedades cooperativas tiveram sua importância reconhecida constitucionalmente, merecendo tratamento tributário especialmente adequado às suas atividades.

Denominam-se atos cooperativos os praticados entre as cooperativas e seus associados, e pelas cooperativas entre si, quando associadas, para consecução de seus objetivos sociais.

O ato cooperativo não implica operação de mercado, nem contrato de compra e venda de produto ou mercadoria (art. 79 da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971).

Sociedade cooperativa é aquela formada por pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, sem objetivo de lucro (art.3º da mesma lei retrocitada).

A Constituição requer que os atos decorrentes das atividades essenciais destas sociedades tenham um tratamento tributário adequado à sua natureza, isto é, segundo o princípio estabelecido no art.145, § 1º desta Constituição (capacidade tributária), inclusive através de isenções, diferimentos e benefícios fiscais." (grifos meus) (A Constituição do Brasil 1988, Price Waterhouse, 1989, p.628-629)

(23) A Ministra Eliana Calmon denomina de "não-incidência" a desoneração. Leia-se: "Acórdão: RESP 215311/MA - RECURSO ESPECIAL (1999/0044189-3)

Fonte: DJ DATA: 11/12/2000 PG. 00188

JBCC. VOL. 00187 PG. 00128

LEXSTJ VOL. 00141 PG. 00133

Relator: MIN. ELIANA CALMON (1114)

Data da Decisão: 10/10/2000.

Órgão Julgador: T2 - SEGUNDA TURMA

Ementa: TRIBUTÁRIO - ISS - COOPERATIVA MÉDICA - ATIVIDADE EMPRESARIAL.

I. A cooperativa, quando serve de mera intermediária entre seus associados (profissionais) e terceiros, que usam do serviço médico, está isenta de tributos, porque exerce atos cooperativos (art. 79 da Lei n. 5.764/71) e goza de não-incidência.

(...)

Votaram com a Relatora os Ministros Paulo Gallotti, Franciulli Netto e Francisco Peçanha Martins" (grifos meus).

(24) Para mim, toda a responsabilidade tributária na sujeição passiva implica substituição. Escrevi sobre o artigo 128 do CTN que: "O artigo começa com a expressão "sem prejuízo do disposto neste capítulo", que deve ser entendida como exclusão da possibilidade de a lei determinar alguma forma de responsabilidade conflitante com a determinada no Código.

Isto vale dizer que a responsabilidade não prevista pelo Capítulo pode ser objeto de lei, não podendo, entretanto, a lei determinar nenhuma responsabilidade que entre em choque com os artigos 128 a 138.

A seguir o artigo continua: "a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa", determinando, de plano, que esta escolha de um terceiro SOMENTE PODE SER FEITA SE CLARA, INEQUÍVOCA E CRISTALINAMENTE EXPOSTA NA LEI.

Uma responsabilidade, entretanto, sugerida, indefinida, pretendidamente encontrada por esforço de interpretação nem sempre juridicamente fundamentada, NÃO PODE SER ACEITA, diante da nitidez do dispositivo, que exige que a determinação deva ser apresentada "de forma expressa" (Comentários ao CTN, ed. 2002, Ed. Saraiva, p. 223/4).

(25) Suplemento Tributário LTR n. 39/96, p. 211.

(26) Comentários à Constitução do Brasil, 6º vol., tomo I, ob. cit. p. 202.

(27) Maria Helena Diniz esclarece: "FATURAMENTO. Direito Comercial. Formação ou extração da fatura comercial relativa às mercadorias vendidas" (Dicionário Jurídico, vol. 2, Ed. Saraiva, 1998, p. 524).

(28) Reitero que a consulente não emite "fatura" por não exercer atividade mercantil. Leia-se Hugo de Brito Machado: "O conceito de faturamento, além de estabelecido pela lei complementar, como se acaba de ver, também está consolidado na lei e na doutrina antiga e aceita.

A rigor, em sentido literal, faturamento é a atividade de emitir faturas, e fatura é termo que vem do latim e indica, não apenas no Brasil, mas em todos os países de línguas com a mesma origem da nossa, o documento, ou instrumento do contrato de compra e venda de mercadorias. "Ecrit obligatoire par lequelle vendeurfait connáitre à I'acheteur le détail des marchandises ou des services et y précis les conditions de livraison et de reglement du prix" (Contribuições Sociais - Problemas Jurídicos (Cofins, PIS, CSLL e CPMF), Dialética, São Paulo, 1999, p. 100).

(29) A Resolução CFC n. 944/02 conclui após inúmeras considerações que: "CONSIDERANDO a decisão da Câmara Técnica no Relatório n. 49, de 29 de agosto de 2001;

RESOLVE:

Art. 1º Aprovar a Norma Brasileira de Contabilidade NBC T 10.21 - Entidades Cooperativas Operadoras de Planos de Assistência à Saúde.

Art. 2º Esta Resolução entra em vigor a partir de 1º de janeiro de 2003, sendo encorajada a sua aplicação antecipada.

Brasília, 30 de agosto de 2002 - Contador ALCEDINO GOMES BARBOSA - Presidente".

(30) Leia-se a nota 10.21.1.8 das Normas Brasileiras de Contabilidade: "10.21.1.8. As sobras líquidas do exercício, após as destinações legais e estatutárias, devem ser postas à disposição da assembléia geral para deliberação e, da mesma forma, as perdas líquidas, quando a Reserva Legal for insuficiente para sua cobertura, serão rateadas entre os associados na forma estabelecida no estatuto social, não devendo haver saldo pendente ou acumulado de exercício anterior, devendo a perda não-suportada por esta reserva ser registrada conforme estabelece o item 10.21.2.7.

10.21.1.9 -As Entidades Cooperativas Operadoras de Planos de Assistência à Saúde devem distribuir as sobras líquidas aos seus associados de acordo com a produção de bens ou serviços por eles entregues, em função do volume de fornecimento de bens de consumo e insumos, dentro do exercício social, salvo deliberação em contrário da assembléia geral.

10.21.1.10 -A responsabilidade do associado, para fins de rateio das perdas, perdura para os demitidos, eliminados ou excluídos, até quando aprovadas as contas do exercício social em que se deu o desligamento. Em caso de sobras, aplicam- se as mesmas condições.

10.21.1.11 -Os elementos do patrimônio das Entidades Cooperativas Operadoras de Planos de Assistência à Saúde serão atualizados monetariamente na forma prevista na Resolução CFC nº 900, de 22 de março de 2001, e legislações posteriores.

10.21.1.12- Os fundos previstos na legislação ou nos estatutos sociais são, nesta norma, denominados Reservas".

São Paulo, 25 de junho de 2003.


Ives Gandra da Silva Martins*
ivesgandra@gandramartins.adv.br


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